Uma
das coisas mais complexas no cotidiano de uma Casa Espírita é administrar as
diferenças comportamentais entre os trabalhadores. Aqui e ali, por um motivo ou
por outro, pipocam os atritos e melindres muitas vezes encobertos pelo silêncio
em nome da “caridade”, mas evidentes nos olhares atravessados, nos recadinhos
indiretos e, não raro, no afastamento inexplicável daquele companheiro que
parecia tão entusiasmado... Quando chega a esse ponto é que a guerra de personas
já atingiu o seu ponto máximo.
Não
desanimemos. Onde há gente há problema. Graças a Deus!... Porque conviver
significa oportunidade impar de crescimento. É preciso apenas
saber identificar, respeitar e integrar as diferenças, repensando o conceito
ilusório de que para figurar no seleto rol dos “escolhidos”, todos têm
que estar aptos e disponíveis, todo o tempo, a todo o tipo de
tarefa na Casa Espírita. Estereótipos solapam a autenticidade e favorecem a
hipocrisia.
Somos diferentes e isso obedece a um
propósito Divino. Aquilo que é fácil pra mim já não é para o outro e
vice-versa. Sabemos que é a diversidade das flores que confere harmonia e
beleza a um jardim, porém tudo passa pelo paisagista que traçou canteiros,
combinou cores e formas, considerando, sobretudo, os níveis de resistência e
fragilidade de cada planta para então dispor a sua localização. Também na Casa Espírita pessoas com
personalidade, maturidade e aptidões diversas podem conviver harmonicamente em
sua diversidade, mas o “paisagismo” cabe aos dirigentes.
Pensemos em nossos grupos. Sempre
encontraremos neles um trabalhador tipo “pau pra toda obra.” Dinâmico e
disponível esse irmão é perfeito para tarefas práticas. Mas não o chame para
reuniões de planejamento porque ou não vai comparecer ou vai cochilar.
Já o tipo “certinho” é racional,
organizado e faz questão de tudo “preto no branco”. Quem melhor para a
administração? Afinal, formalizar e controlar são com ele mesmo.
Tem também o “artista”. Afeito ao
lúdico, ele não dispensa a música, o teatro e outras manifestações de arte em
tudo o que faz. Sua sensibilidade enche as reuniões comemorativas daquela emoção
e entusiasmo tão necessários para levantar o ânimo. Ideal para trabalhar com
jovens e crianças, esse companheiro sacode a mesmice, motiva a equipe e
estimula como ninguém a integração fraterna.
Temos ainda o introspectivo, o
extrovertido, o afoito, o ponderado, o questionador, o acomodado, o
“modernoso”, o conservador e por aí vai. E quem de nós se aventuraria a
discorrer sobre a maior ou menor importância desse ou daquele trabalhador,
conforme os perfis aqui relacionados?
Na verdade, todos são insubstituíveis
e indispensáveis em suas peculiaridades porque - enquanto não conseguimos ser
perfeitos – o segredo é nos valer das próprias imperfeições para potencializar
o trabalho. Enquanto uns sonham outros ponderam, uns planejam outros
concretizam, uns organizam outros adornam. E lá vamos nós!... Lidando com as
diferenças e garantindo a continuidade da obra. Enquanto isso vai se aprendendo
a ceder, a ser voto vencido, a discordar sem “rosnar” e tantos outros
exercícios de reforma íntima.
Ninguém espere mar de rosas.
Impossível não haver conflito onde existe diversidade. Aqui é aquele
companheiro veterano que rejeita as sugestões dos recém-chegados porque se
julga o detentor absoluto da experiência; Ali é outro que chega querendo mudar
tudo, desconsiderando aqueles que lá já estavam, muito antes da sua chegada,
construindo o que ele encontrou; Acolá é aquele que quer colocar o mundo dentro
da Casa Espírita; Mais além é aquele outro que quer tirar a Casa Espírita do
mundo... E outros tantos desafios.
Cabe às lideranças observar,
intervir e pacificar. Administrando conflitos prevenimos cisões, pois as
relações são a viga mestra dos grupos, e quando abaladas tudo vem abaixo.
Uma forma eficaz de prevenir é
realizar constantes avaliações das atividades. Mas avaliar não é colocar os
companheiros no paredão. Avaliar é reunir a equipe periodicamente para analisar
o que está sendo feito, em clima de leveza e fraternidade, discutindo
dificuldades e possibilidades com vistas a manter ou corrigir a rota onde for
preciso.
Mas é também imprescindível repensar as
decisões de cima para baixo. Não raro a diretoria decide e os demais
trabalhadores executam, sem que de alguma forma tenham sido consultados
enquanto elementos fundamentais para as realizações. Questionar nem pensar, sob
pena de inclusão imediata no tratamento de desobsessão diante da afirmativa
paternalista que “o nosso irmão está precisando muito de preces”. Esta é a
impiedosa pena de descrédito “caridosamente” imputada àqueles que ousam
“subverter” a ordem vigente. Estrategicamente, neutraliza-se a ovelha rebelde
para apascentar o rebanho.
Diante disso a gente se pergunta:
Quando é que nós espíritas vamos conseguir distinguir autoridade de
autoritarismo? Quando é que vamos deixar de medir o valor dos companheiros
pelos cargos que ocupam ou pelos títulos que ostentam? Quando é que vamos
parar, enquanto dirigentes, de usar os trabalhadores por mão de obra
passiva para projetos personalistas? Quando deixaremos de tomar questionamentos
legítimos como “influência de obsessores”? É urgente abandonar tais heranças
reacionárias do passado e avançar para a postura ética e fraterna que se espera
de uma liderança espírita.
Um verdadeiro líder busca sempre o
entendimento amoroso - em nível individual ou coletivo – quando os problemas
surgem. Em momentos de crise não silencia, nem impõe, dialoga. Omissão por medo
de provocar ruptura é um equívoco. Se não criamos coragem de intervir junto aos
conflitos, contribuiremos para que se avolumem. E quando menos se espera... lá
estão eles!... Substituindo o saudável prazer de estar junto pela obrigação do
compromisso assumido “do lado de lá”, esvaziando grupos e corações.
Liderança é responsabilidade. É ter
claro o papel que nos compete como mediadores e aglutinadores. Porém, como irmãos
de caminhada e não como “donos das almas” ou “da causa”, porque senão, à menor
contrariedade, vamos ser os primeiros a fazer as malas e sair por aí atrás do
utópico grupo ideal e - o que é mais grave - arrastando conosco ou deixando
para trás “seguidores” divididos e desnorteados.
As chances de acertar são
infinitamente maiores quando nos dispomos a exercitar esse tal amor, que não é
algo tão longínquo assim; Que começa pela valorização dos pontos positivos do
outro em detrimento dos negativos que possa ter; Pelo exercício da tolerância,
não por amarmos todos de forma igual - porque isso não acontece nesse estágio
em que nos encontramos - mas por reconhecer em nós muitas mazelas a serem
toleradas.
Se não buscarmos nutrir pelos
companheiros esse amor possível, continuaremos a brincar de espírita
bonzinho e, no fundo, só nos aturando, assim como qualquer profissional no seu
ambiente de trabalho. Mas se existir afeto, a gente cede aqui, cede ali... Ou
não cede - porque existem coisas que não dá para transigir - mas diz o que tem
que dizer de forma firme, porém cuidadosa. E assim, lembrando Jesus, vamos
conversando com o nosso irmão em reservado “e se ele vos entender”- diz o
Mestre - ”então tereis ganhado o vosso irmão”.
Difícil?... Mas quem foi que disse
que é fácil evoluir?... E que se evolui sem conviver?
Pensemos nisto.
Isso é de primordial importancia para a elevação de nossas almas! Tudo que nos é imposto, devemos converter em objetos de elevação! Muita Paz!!!
ResponderExcluirEstou publicando todas as matérias, que leio neste blog, no twitter e no facebook. Esta não poderia deixar de lado. Tá muito boa! Parabéns!
ResponderExcluirFicamos gratíssimos a você Vera! O nosso propósito é o de promover reflexões amplas sobre os processos desenvolvidos em todas as células que organizam o corpo do movimento espírita.
ResponderExcluir'Um verdadeiro líder busca sempre o entendimento amoroso - em nível individual ou coletivo – quando os problemas surgem. Em momentos de crise não silencia, nem impõe, dialoga.'
ResponderExcluirEis a grande dificuldade quando existe a questão do PODER!!
tudo que podermos fazer para melhorarmos tanto a nós quanto aos nossos irmãos é sempre muito bem recebido.
ResponderExcluirquanto mais nos é esclarecido através de estudo e de trabalho o orgulho ainda é o maior impesílio pra o desempenho de nossas casas. menos criticas e mais organização e trabalho.
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