“Não olvideis que o objetivo
essencial, exclusivo, do Espiritismo é vosso adiantamento”. Allan Kardec, O
Livro dos Médiuns, capítulo XXVI, item 292
Por Alkíndar de Oliveira (*)
A
nossa rica língua portuguesa nos traz vocábulos que, numa análise apressada,
podem nos confundir sobre seus reais significados. Por exemplo, muitas vezes
confundimos o significado das palavras “importante” e “fundamental”. Parece que
o sentido de ambas as palavras é o mesmo, e na realidade elas têm sentidos
diferentes e complementares. Para melhor entendermos os significados destas
palavras, vejamos um exemplo: Numa refeição o prato e os talheres são
importantes, mas a comida é fundamental. Isto é, sem o prato e talheres
poderíamos até nos alimentar, mas sem a comida, não. Outro exemplo: Se como
cristãos quisermos evoluir espiritualmente, termos uma religião é importante,
mas termos Jesus como guia e modelo é fundamental. Isto é, sem uma religião
formal poderíamos até crescer interiormente, mas sem ter Jesus como guia e
modelo, não.
Com as
informações acima, podemos refletir: O Espiritismo é importante ou fundamental
para nossa evolução espiritual?
Para
aumentar nossa possibilidade de acerto na resposta da questão acima, vejamos outra
pergunta: Sermos adeptos do Espiritismo está fazendo com que todos nós, seus
seguidores, sejamos pessoas espiritualizadas? Ou ainda outra: Se não
conhecêssemos o Espiritismo, não haveria nenhuma outra possibilidade ou caminho
para chegarmos a Jesus?
Agora,
creio que já dá para concluir que, cristãos que somos, o Espiritismo é
importante, mas fundamental é seguirmos Jesus. Portanto, para nós espíritas, o
Espiritismo é o meio; seguir Jesus é o fim (no sentido de finalidade maior). Em
outras palavras, se, de maneira alegórica atingir o cume da montanha
significasse a vivência cristã, então para nós o Espiritismo é a estrada (o
meio) para chegarmos ao cume (o fim).
Confundindo o Fim com o Meio
Vejo
como fundamental a conclusão e a mensagem do parágrafo anterior, pois hoje em
muitos de nós o amor à Doutrina Espírita é maior do que nosso amor à Jesus!
Explico: Desentendemo-nos com irmãos nossos em defesa da Doutrina, enquanto
nosso Mestre prega paz, fraternidade, amor!!!
Muitos
de nós amamos mais a Casa Espírita do que amamos os seus frequentadores!!!
Muitos
de nós hostilizamos nossos irmãos de fé, pelo amor à nossa Doutrina!!!
Muitos
de nós criamos inimizades em nosso meio “por amor à causa”. Esquecendo-nos de
que “a causa é o amor”.
Muitos
de nós defendemos agressivamente a “pureza doutrinária” do Espiritismo,
esquecendo-nos, como disse Divaldo Franco, de que “a Doutrina Espírita não
precisa de defensores. Se ela é uma doutrina pura, ela é inatacável”. Isto é,
como espíritas conscientes precisamos não mais defender a pureza doutrinária,
mas sim exercitarmos a vivência doutrinária.
Enfim,
estamos confundindo o “meio” com o “fim”. Para muitos de nós, espíritas, a
Doutrina está se tornando mais importante do que sua finalidade!!! Estamos
colocando nossa “defesa da Doutrina” acima dos preceitos de Kardec e do nosso
Mestre Jesus.
Mente de Aprendiz
Por mais
que as deduções acima sobre nossa Doutrina sejam simplesmente a transcrição de
fatos reais, nem sempre as vemos como verdade. Insistimos em não darmos crédito
a estes fatos. Os nossos belos discursos “prontos” questionam a validade dos
incontestáveis relatos acima. Com os fatos reais e nossos discursos prontos se
digladiando, por que não darmo-nos a oportunidade de termos uma visão ampliada
da nossa real situação de espíritas militantes? Se quisermos ir ao encontro
dessa indagação, creio que para bem aproveitarmos da benção de sermos
espíritas, é preciso que nossos pensamentos e atitudes sejam frutos da mente de
aprendiz. O que geralmente não estamos habituados. Somos teimosos! Um exemplo:
Certa vez Galileu reuniu os principais professores da Universidade de Pizza à
frente da torre homônima para provar, cientificamente, que dois objetos com
pesos diferentes lançados de uma mesma altura e num mesmo momento, levariam o
mesmo tempo para atingir o solo. Galileu conseguiu provar aos estupefatos
professores que o peso do objeto não é preponderante. Isto é, que qualquer que
fosse o peso de cada um dos objetos, eles chegariam juntos ao solo. Galileu
provou tal fato. Sabe o que os professores continuaram lecionando? Continuaram
por muitos anos ensinando aos seus alunos o contrário do que Galileu havia
cientificamente provado.
O
exemplo acima comprova que nem sempre fatos ou palavras persuasivas nos
estimulam a mudar. A saída para este impasse é, repito, adotarmos a mente de
aprendiz.
Mas o que é mente de aprendiz?
Mente
de aprendiz é a qualidade que faz com que estudemos um livro, um tema ou
assunto qualquer, com a mente aberta. É um difícil hábito a desenvolver.
Difícil porque todas as nossas convicções estão sustentadas em nossos modelos
mentais fortemente arraigados. Nunca lemos ou escrevemos algo de forma
parcial'>imparcial. A parcial'>imparcialidade não existe. Sempre
estaremos interpretando nossas leituras e, na escrita, interpretando nossas
“verdades”. Portanto, se o nosso propósito for sermos eternos aprendizes, temos
que (por exemplo), na leitura, nos abstrair ao máximo para que nossa natural
parcialidade não perturbe nossa aprendizagem.
Se, de
forma rotineira, nós não colocarmos em ação nossa mente de aprendiz, daqui a
dez anos estaremos rindo (ou chorando!), constrangidos, das bobagens das nossas
certezas de hoje.
A
pessoa competente é aquela que sempre está perguntando a si mesma: “No que, ou
em que, minha competência acoberta a minha ignorância?”
Quando
Sócrates foi considerado pela Pitoniza de Delfos como o ser mais inteligente da
Terra, ele, sabiamente, esclareceu: “Sabes por que me consideram mais sábio do
que os outros? É porque eu conheço a minha ignorância. O conhecimento da
própria ignorância é o início da sapiência.”
É
paradoxal, mas eis a realidade: é sinal de inteligência consideramos-nos
competentes (com boa autoestima) e, ao mesmo tempo, ignorantes.
Objetivo deste artigo
O
objetivo deste artigo é mostrar, aos integrantes do grupo “Mente de Aprendiz” o
antídoto às atitudes exemplificadas no subitem mais acima “Confundindo o Fim
com o Meio”.
Nosso
mestre e benfeitor Bezerra de Menezes nos mostra qual é o antídoto para não
confundirmos o “fim” com o “meio”, isto é, ele nos mostra como compreendermos o
que é ser verdadeiro espírita. A resposta dele está no tripé: Fraternidade –
Amor – Educação.
O
primeiro exercício para utilizarmos desse antídoto é nos conhecermos. Pois o autoconhecimento
é o primeiro degrau de nossa ascensão espiritual. E conhecermo-nos é um
processo que demanda, sobretudo, humildade.
A
seguir menciono alguns meios para quem quiser melhor se conhecer em relação à
nossa Doutrina.
Estaremos
enxergando erroneamente nossa religião como “fim” e não como “meio”, se:
a)
Geramos conflitos destrutivos com nossos irmãos espíritas por causa do
Espiritismo;
b)
Colocamos nossos princípios religiosos acima do exercício da fraternidade entre
irmãos;
c)
Queremos que os princípios de nossa Doutrina mudem os outros, em vez de
primeiramente procuramos através deles mudar a nós mesmos;
d)
Exercemos trabalho voluntário para “ajudar o próximo”, sem aproveitarmos da
oportunidade de nos autoeducarmos;
e)
Exercemos cargo de liderança espírita como “obrigação”, sem sentirmos alegria
pelo exercício da função e sem aproveitamos da oportunidade para nos autoeducarmos.
Caros
irmãos espíritas, se por acaso nos identificarmos em quaisquer das situações
logo acima, chegou a hora de mudarmos.
Em seu
livro Espiritualidade, o teólogo Leonarfo Boff relata que perguntou ao Dalai
Lama qual era a melhor a religião. Leonardo Boff diz no livro que até imaginou
que Dalai Lama iria dizer que as melhores religiões são as orientais, ricas em
tradições e em questões filosóficas. Mas, contrariando toda a lógica de Boff, a
resposta sábia foi: “A melhor religião é
aquela que te faz melhor”. Conscientes de que o Espiritismo contem todos os
ensinamentos para sermos verdadeiros cristãos, questionemo-nos duplamente:
Temos em nossa vivência doutrinária consciência do que é “importante” e do que
é “fundamental”? O Espiritismo está nos fazendo pessoas melhores?
Para
finalizar, atentemos a Allan Kardec, em “O
Livro dos Médiuns”, capítulo XXIX, item 350: “Que importa crer na existência dos espíritos, se essa crença não faz
que aquele que a tem se torne melhor, mais benigno e indulgente, mais humilde e
paciente na adversidade”.
(*) Alkindar
de Oliveira, Palestrante, Escritor e Consultor de Empresas radicado em São Paulo-SP,
profere palestras e ministra treinamentos comportamentais em todo o Brasil.
Muito bom esse texto do Confrade Alkindar, especialmente a citação final de "O Livro dos Médiuns". Acho que devemos pensar um pouco sobre o nosso comportamento como espíritas. Como a Doutrina Espírita poderá renovar a sociedade, se nós que a professamos não cuidarmos de nos reformar primeiro? Como podemos receitar para os outros um remédio que não somos capazes de tomar,embora tenhamos dele uma grande necessidade?
ResponderExcluirParabéns ao Blog pela transcrição.
Castro
Excelente Texto! Excelente reflexão!
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