quarta-feira, 14 de novembro de 2012

ESPIRITISMO: MEIO OU FIM?



“Não olvideis que o objetivo essencial, exclusivo, do Espiritismo é vosso adiantamento”. Allan Kardec, O Livro dos Médiuns, capítulo XXVI, item 292


Por Alkíndar de Oliveira (*)

A nossa rica língua portuguesa nos traz vocábulos que, numa análise apressada, podem nos confundir sobre seus reais significados. Por exemplo, muitas vezes confundimos o significado das palavras “importante” e “fundamental”. Parece que o sentido de ambas as palavras é o mesmo, e na realidade elas têm sentidos diferentes e complementares. Para melhor entendermos os significados destas palavras, vejamos um exemplo: Numa refeição o prato e os talheres são importantes, mas a comida é fundamental. Isto é, sem o prato e talheres poderíamos até nos alimentar, mas sem a comida, não. Outro exemplo: Se como cristãos quisermos evoluir espiritualmente, termos uma religião é importante, mas termos Jesus como guia e modelo é fundamental. Isto é, sem uma religião formal poderíamos até crescer interiormente, mas sem ter Jesus como guia e modelo, não.

Com as informações acima, podemos refletir: O Espiritismo é importante ou fundamental para nossa evolução espiritual?
Para aumentar nossa possibilidade de acerto na resposta da questão acima, vejamos outra pergunta: Sermos adeptos do Espiritismo está fazendo com que todos nós, seus seguidores, sejamos pessoas espiritualizadas? Ou ainda outra: Se não conhecêssemos o Espiritismo, não haveria nenhuma outra possibilidade ou caminho para chegarmos a Jesus?

Agora, creio que já dá para concluir que, cristãos que somos, o Espiritismo é importante, mas fundamental é seguirmos Jesus. Portanto, para nós espíritas, o Espiritismo é o meio; seguir Jesus é o fim (no sentido de finalidade maior). Em outras palavras, se, de maneira alegórica atingir o cume da montanha significasse a vivência cristã, então para nós o Espiritismo é a estrada (o meio) para chegarmos ao cume (o fim).


Confundindo o Fim com o Meio
Vejo como fundamental a conclusão e a mensagem do parágrafo anterior, pois hoje em muitos de nós o amor à Doutrina Espírita é maior do que nosso amor à Jesus! Explico: Desentendemo-nos com irmãos nossos em defesa da Doutrina, enquanto nosso Mestre prega paz, fraternidade, amor!!!
Muitos de nós amamos mais a Casa Espírita do que amamos os seus frequentadores!!!
Muitos de nós hostilizamos nossos irmãos de fé, pelo amor à nossa Doutrina!!!
Muitos de nós criamos inimizades em nosso meio “por amor à causa”. Esquecendo-nos de que “a causa é o amor”.
Muitos de nós defendemos agressivamente a “pureza doutrinária” do Espiritismo, esquecendo-nos, como disse Divaldo Franco, de que “a Doutrina Espírita não precisa de defensores. Se ela é uma doutrina pura, ela é inatacável”. Isto é, como espíritas conscientes precisamos não mais defender a pureza doutrinária, mas sim exercitarmos a vivência doutrinária.
Enfim, estamos confundindo o “meio” com o “fim”. Para muitos de nós, espíritas, a Doutrina está se tornando mais importante do que sua finalidade!!! Estamos colocando nossa “defesa da Doutrina” acima dos preceitos de Kardec e do nosso Mestre Jesus.

Mente de Aprendiz
Por mais que as deduções acima sobre nossa Doutrina sejam simplesmente a transcrição de fatos reais, nem sempre as vemos como verdade. Insistimos em não darmos crédito a estes fatos. Os nossos belos discursos “prontos” questionam a validade dos incontestáveis relatos acima. Com os fatos reais e nossos discursos prontos se digladiando, por que não darmo-nos a oportunidade de termos uma visão ampliada da nossa real situação de espíritas militantes? Se quisermos ir ao encontro dessa indagação, creio que para bem aproveitarmos da benção de sermos espíritas, é preciso que nossos pensamentos e atitudes sejam frutos da mente de aprendiz. O que geralmente não estamos habituados. Somos teimosos! Um exemplo: Certa vez Galileu reuniu os principais professores da Universidade de Pizza à frente da torre homônima para provar, cientificamente, que dois objetos com pesos diferentes lançados de uma mesma altura e num mesmo momento, levariam o mesmo tempo para atingir o solo. Galileu conseguiu provar aos estupefatos professores que o peso do objeto não é preponderante. Isto é, que qualquer que fosse o peso de cada um dos objetos, eles chegariam juntos ao solo. Galileu provou tal fato. Sabe o que os professores continuaram lecionando? Continuaram por muitos anos ensinando aos seus alunos o contrário do que Galileu havia cientificamente provado.
O exemplo acima comprova que nem sempre fatos ou palavras persuasivas nos estimulam a mudar. A saída para este impasse é, repito, adotarmos a mente de aprendiz.

Mas o que é mente de aprendiz?
Mente de aprendiz é a qualidade que faz com que estudemos um livro, um tema ou assunto qualquer, com a mente aberta. É um difícil hábito a desenvolver. Difícil porque todas as nossas convicções estão sustentadas em nossos modelos mentais fortemente arraigados. Nunca lemos ou escrevemos algo de forma parcial'>imparcial. A parcial'>imparcialidade não existe. Sempre estaremos interpretando nossas leituras e, na escrita, interpretando nossas “verdades”. Portanto, se o nosso propósito for sermos eternos aprendizes, temos que (por exemplo), na leitura, nos abstrair ao máximo para que nossa natural parcialidade não perturbe nossa aprendizagem.
Se, de forma rotineira, nós não colocarmos em ação nossa mente de aprendiz, daqui a dez anos estaremos rindo (ou chorando!), constrangidos, das bobagens das nossas certezas de hoje.
A pessoa competente é aquela que sempre está perguntando a si mesma: “No que, ou em que, minha competência acoberta a minha ignorância?”
Quando Sócrates foi considerado pela Pitoniza de Delfos como o ser mais inteligente da Terra, ele, sabiamente, esclareceu: “Sabes por que me consideram mais sábio do que os outros? É porque eu conheço a minha ignorância. O conhecimento da própria ignorância é o início da sapiência.”
É paradoxal, mas eis a realidade: é sinal de inteligência consideramos-nos competentes (com boa autoestima) e, ao mesmo tempo, ignorantes.

Objetivo deste artigo
O objetivo deste artigo é mostrar, aos integrantes do grupo “Mente de Aprendiz” o antídoto às atitudes exemplificadas no subitem mais acima “Confundindo o Fim com o Meio”.
Nosso mestre e benfeitor Bezerra de Menezes nos mostra qual é o antídoto para não confundirmos o “fim” com o “meio”, isto é, ele nos mostra como compreendermos o que é ser verdadeiro espírita. A resposta dele está no tripé: Fraternidade – Amor – Educação.
O primeiro exercício para utilizarmos desse antídoto é nos conhecermos. Pois o autoconhecimento é o primeiro degrau de nossa ascensão espiritual. E conhecermo-nos é um processo que demanda, sobretudo, humildade.
A seguir menciono alguns meios para quem quiser melhor se conhecer em relação à nossa Doutrina.
Estaremos enxergando erroneamente nossa religião como “fim” e não como “meio”, se:
a) Geramos conflitos destrutivos com nossos irmãos espíritas por causa do Espiritismo;
b) Colocamos nossos princípios religiosos acima do exercício da fraternidade entre irmãos;
c) Queremos que os princípios de nossa Doutrina mudem os outros, em vez de primeiramente procuramos através deles mudar a nós mesmos;
d) Exercemos trabalho voluntário para “ajudar o próximo”, sem aproveitarmos da oportunidade de nos autoeducarmos;
e) Exercemos cargo de liderança espírita como “obrigação”, sem sentirmos alegria pelo exercício da função e sem aproveitamos da oportunidade para nos autoeducarmos.
Caros irmãos espíritas, se por acaso nos identificarmos em quaisquer das situações logo acima, chegou a hora de mudarmos.
Em seu livro Espiritualidade, o teólogo Leonarfo Boff relata que perguntou ao Dalai Lama qual era a melhor a religião. Leonardo Boff diz no livro que até imaginou que Dalai Lama iria dizer que as melhores religiões são as orientais, ricas em tradições e em questões filosóficas. Mas, contrariando toda a lógica de Boff, a resposta sábia foi: “A melhor religião é aquela que te faz melhor”. Conscientes de que o Espiritismo contem todos os ensinamentos para sermos verdadeiros cristãos, questionemo-nos duplamente: Temos em nossa vivência doutrinária consciência do que é “importante” e do que é “fundamental”? O Espiritismo está nos fazendo pessoas melhores?

Para finalizar, atentemos a Allan Kardec, em “O Livro dos Médiuns”, capítulo XXIX, item 350: “Que importa crer na existência dos espíritos, se essa crença não faz que aquele que a tem se torne melhor, mais benigno e indulgente, mais humilde e paciente na adversidade”.


(*) Alkindar de Oliveira, Palestrante, Escritor e Consultor de Empresas radicado em São Paulo-SP, profere palestras e ministra treinamentos comportamentais em todo o Brasil.

2 comentários:

  1. Muito bom esse texto do Confrade Alkindar, especialmente a citação final de "O Livro dos Médiuns". Acho que devemos pensar um pouco sobre o nosso comportamento como espíritas. Como a Doutrina Espírita poderá renovar a sociedade, se nós que a professamos não cuidarmos de nos reformar primeiro? Como podemos receitar para os outros um remédio que não somos capazes de tomar,embora tenhamos dele uma grande necessidade?
    Parabéns ao Blog pela transcrição.
    Castro

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  2. Excelente Texto! Excelente reflexão!

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