Desnecessário repetir ao espírita quanto ao nicho social onde Jesus nasceu e desenvolveu toda a sua caminhada espiritual sobre a Terra. Jesus decidiu que nasceria e morreria pobre e excluído, cujas companhias não frequentariam os grandes salões nem possuiriam autoridade política ou eclesial, enfim que não estaria amparado pelos poderosos de sua época. Às voltas com os pobres do mundo dava espaço para que todos os desafortunados participassem da partilha dos parcos recursos e alimentos, em parte chegados por doações. Seria um fracasso a sua missão caso tivesse decidido outros amigos, outro ambiente? Não o sabemos, apenas sabemos que foi dessa forma.
O fato é que a sua escolha pode nos remeter a reflexões que trazem algumas ferramentas facilitadoras da compreensão dos males que vitimam o nosso tempo. Precisou ser intrépido porque não teria o apoio das classes dominantes. Deu lições de flexibilidade, pois era necessário se reinventar diante dos impedimentos. Mostrou-se inclusivo, uma vez que não temia os julgamentos que aqueles que o acompanhavam recebiam da população. Distribuiu lições de generosidade, não apenas pela divisão dos parcos recursos com quem tinha menos, mas principalmente por acolher tantos que estavam desenganados de si mesmos. Tornou-se confiável aos seus seguidores sem lhes oferecer barganhas, e como pouco ou quase nada tinha para dar em bens materiais, deu a si mesmo como herança.
Numa de suas prédicas mais vigorosas chama à compreensão para os que se atiram na atualidade ao “self-made man” (tradução literal: o homem feito por si próprio). Foi em Mateus (VI; 19 - 20): “Não acumuleis para vós outros tesouros sobre a terra, onde a traça e a ferrugem corroem e onde ladrões escavam e roubam; mas ajuntai para vós outros tesouros no céu, onde traça nem ferrugem corrói, e onde ladrões não escavam, nem roubam; porque, onde está o teu tesouro, aí estará também o teu coração”. Também estabeleceu critérios que destravaram a necessidade da pessoa atuar no mundo terreno sem perder a noção da atuação em campo de pertencimento espiritual e utilizou uma moeda com esfinge do poderoso de ocasião para afirmar “daí a César o que é de César e a Deus o que é de Deus” (Idem XXII; 21).
Jesus não pareceu ter ilusões quanto à dureza de viver-se uma encarnação, nem vendeu um discurso fácil. Quando precisou expurgar seus próprios demônios o fez. Tendo que caminhar diante do populacho vendido por pechinchas, que lhe proferia impropérios, conseguiu enxergar seres fracos que desconheciam a própria situação e se embalavam por promessas de curta duração. Entendia que a construção que viera propor ainda precisaria do tempo, longo e implacável, para se pôr de pé.
Nos combates nossos de cada dia, vale escutar o que disse Jesus e procurar a herança que nos deixou. Certamente não serão ofertas de salvação gratuita, tampouco caminhos de sucesso no mundo das aparências, sequer o alento fantasioso de uma eternidade de delícias e fruição em um céu inexistente. Procuremos o eco de suas palavras em nossa alma. “Tenho-vos dito isto, para que em mim tenhais paz; no mundo tereis aflições, mas tende bom ânimo, eu venci o mundo” (João XVI; 33). Eis aí uma das chaves do seu tesouro, a verdadeira herança de sua passagem pelo planeta. Vamos inundar o mundo de Paz, esse o legado de Jesus.
Creio que, cada vez mais, precisaremos ter melhores noções do Mestre e da simbologia que o envolve estudando o Jesus Histórico.
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