Eu já havia conversado com os meus guias, com Deus, com Jesus ou com qualquer um acima de direito, que não queria duas coisas na vida: nenhum problema nos olhos, de que tenho aflição extrema e nenhum problema na mama. Para o segundo caso, tomei todas as precauções possíveis: nunca fiz reposição hormonal, sempre evitei desodorantes spray, nunca usei sutiã apertado e me consolava dizendo que não há um caso de câncer de mama na família, apesar de casos de outros tipos câncer de todos os lados: pai, mãe, avós…
Meses atrás, porém, apalpei um nódulo no banho. Fiquei um pouco preocupada, mas não pude ir ver logo e não me esforcei para contornar os obstáculos – COVID ainda atuando, o carro estava ruim e não estava licenciado para ir a SP, não tinha com quem deixar meu pai… desculpas?
Passaram-se alguns meses. E eu sempre me confortando: não temos câncer de mama na família. Processo de negação?
Num dia, na semana passada, vi que o nódulo estava maior e doendo, e fiquei a noite em claro, já além de preocupada, aflita.
No dia seguinte, marquei os exames numa das melhores referências em câncer no Brasil, o hospital AC Camargo, em São Paulo, onde aliás meu pai trata há 20 anos de um câncer nas cordas vocais, agora em remissão. Felizmente o meu convênio cobre totalmente qualquer procedimento neste hospital – convênio pelo qual me mato para pagar. Minha conta mais alta.
E fui para a mamografia e para o ultrassom de mamas. Já tinha os pedidos que minha endócrino – Glaucia Duarte, com quem também já falei durante o sufoco dos últimos dias – havia feito ainda durante a pandemia. Não fazia esses exames de rotina desde antes do pesadelo pandêmico.
O primeiro susto: o médico do ultrassom chamou o outro e os dois examinaram longamente e avisaram que eu precisaria ver aquilo com urgência, que havia um nódulo suspeito no seio e um linfonodo na axila.
O olhar de preocupação e o longo silêncio dos dois já me abalaram.
E aí as coisas se sucederam. Passei numa médica do mesmo hospital e ela (coisa por mim nunca vista) ao me dar a notícia de que tinha muita chance de ser câncer, pegou nas minhas mãos e olhou nos meus olhos – depois soube que se trata de um protocolo – Spikes – para dar notícias ruins. Mas nunca havia visto tal protocolo posto em prática por qualquer médico.
E ontem foi o dia da biópsia e enquanto escrevo isso, ainda não sei o resultado – só sei por enquanto, que a classificação do nódulo é BI – RADS 4c – o que significa uma enorme chance de ser maligno.
Fiquei mal… não tenho o mínimo medo da morte, embora não tenha o mínimo desejo de morrer agora. Ainda tenho muita coisa a fazer e algumas pessoas de quem cuidar, sobretudo minha responsabilidade direta, meu pai de 85 anos. Mas uma série de assombrações me tiraram o chão: como vou trabalhar – e dependo do trabalho de cada dia para comer, pagar as contas e o convênio? Quem vai cuidar do meu pai, que ainda tem autonomia, mas está bastante dependente de mim? E meus cursos, meus pacientes, meus livros, minhas lives e toda a multidão de coisas que faço?
“Slow down, Doris” – me disse uma pessoa amada, Franklin, que me chama por esse apelido.
“Ah, minha amiga! Sei que o susto é grande, mas abandona todas as tuas inseguranças, inclusive as financeiras, porque tu e teu pai não estão em perigo. Haverá sempre aqueles que inspiraremos, e que estarão ao teu lado para, se preciso for, amparar-te, enquanto completas as lições que a Vida – outro nome para Deus – quer te ensinar” – disse um espírito amigo pela psicografia do amigo Rodrigo.
Ante o susto e a aflição, procurei familiares e amigos deste e do outro lado da vida. Mensagens, telefonemas, orações, evocações, reuniões mediúnicas… e recebi uma avalanche de amor! Muitos me oferecendo ajuda financeira, preces, companhia, hospedagem em São Paulo….
Na noite de quinta, um dia antes da biópsia, reuni-me presencialmente com nosso grupo mediúnico. Durante as orações e entre as mensagens que recebi, apresentou-se D.Addy, uma alma muito querida, que foi médium de cura em vida, com quem convivi e trabalhei durante mais de 30 anos. E ela me disse: “vou te acompanhar em todo processo”.
No dia seguinte, ontem, era o dia para mim já aflitivo, pois implicava em dois desafios: enfrentar a ressonância magnética porque tenho claustrofobia, e saber e sentir que estavam enfiando uma agulha no meu seio – meu maior medo, porque sempre considerei muito aflitivo. Fui acompanhada pela Claudia Mota, uma das minhas mais próximas amigas-irmãs maternas.
Pois não é que tirei de letra? Durante a ressonância, meditei, orei e até cheguei a me soltar do corpo, mesmo com todo aquele barulho infernal.
E durante a biópsia, bem quando estavam enfiando a agulha da anestesia – procedimento aliás feito por uma delicadíssima médica nascida em Montes Claros (é claro que falamos de Darcy Ribeiro), ouvi D. Addy me dizendo: “nunca iria deixar de acompanhar você nesse momento, você sempre acompanhou minha filha quando ela teve câncer de mama…” E então me lembrei do que não lembrava mais. De fato, estive sempre com a filha da D.Addy, a Neyde, que mais tarde teria metástase e viria a falecer antes da mãe, indo fazer orações, dando passes, prescrevendo receitas mediúnicas homeopáticas para diminuir os efeitos da químio (durante muitos anos fiz receituário mediúnico e depois deixei por falta de tempo). E ali estava a Addy em espírito, me confortando. Quase nem senti a agulha no meu seio.
À espera do resultado da biópsia, agora estou calma, preenchida de amor e aceitando o que vier, para enfrentar com coragem e fé, claro que, preferindo que o resultado seja negativo.
Primeiras lições colhidas nesses poucos dias:
· Por mais queiramos ter controle de tudo, a vida flui além da nossa vontade e nos apresenta desafios inesperados.
· O bem que se planta, por mais singelo e despretensioso, sempre é fecundado por Deus e vamos colhê-lo mais adiante, quando menos esperamos.
· O universo tem amor em abundância, basta precisarmos e nos abrirmos para ele, que nos sentimos fartos e amparados.
· “O senhor é meu pastor, nada me faltará!” Salmo que me acompanha diariamente e que ganhou novos sentidos nesses últimos dias.
Resolvi escrever esse diário, porque a escrita pode ser sempre terapêutica, como me ensinou o querido amigo e terapeuta, Julio Peres, e porque pode ajudar outras pessoas. E já como resultado das meditações desse primeiro impacto, fiz hoje a poesia abaixo:
Irmã morte
A morte sempre aparece
Como um sinal de vida
Anda à espreita, escondida
Atrás de qualquer assombro
Caminha no ombro a ombro
De nossa jornada cumprida
De nossa saudade mais linda
De nossa pendência perdida!
É preciso estar sempre pronto
Colando os pedaços esparsos
Desconfrontando o confronto
Retomando silêncios e abraços
Usando com muita fartura
Todo perdão que cura
E toda união que costura…
Assim, a morte é uma irmã
Bem vinda quando vier,
Na hora que Deus quiser
Na fresta de nova manhã
Com gosto de aurora e romã,
Com gosto de casa, agasalho e avelã!
Testemunho forte e impactante. Bendita seja a Doutrina Espírita que oferece um lastro para a busca das respostas mesmo em situação que tem o potencial de solapar a serenidade, como essa que o texto da querida Dora reporta. Nossas orações e vibrações em sua direção. Roberto Caldas
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