quinta-feira, 21 de abril de 2022

TRAGÉDIAS NATURAIS - PREVISÍVEIS OU INEVITÁVEIS?

 


O mês de fevereiro foi marcado por mais um triste evento, entre tantos outros, considerado praticamente como um flagelo natural, originado pelo acúmulo de água no solo das encostas e também de outros locais, após vários dias de chuva culminando com uma prolongada e forte chuva.

A mídia em geral noticiou largamente, divulgando cenas e depoimentos os mais dolorosos, durante muitos dias... E o que se viu e se soube foi que, logo que possível, muitas pessoas daqueles locais tão drasticamente atingidos, inclusive sobreviventes, começaram a procura por seus familiares, por seus amigos, chamando e tentando afastar lama e pedras com as mãos, na esperança de salvar alguns deles, juntando-se às equipes de bombeiros que logo acorreram...

Contudo, tem-se visto acontecer tristes incidentes como esse há bastante tempo, em várias regiões do nosso país (e de outros países também). Regiões com locais de risco evidente, onde, no entanto, instalam-se centenas ou mais casas. Regiões nas quais técnicos e especialistas facilmente podem constatar a visível possibilidade de eventos drásticos da natureza.

E então, quando dos incidentes, ouve-se pessoas argumentando “mas porque essas criaturas construíram e se alojaram ali naqueles locais perigosos” – daí cabe uma reflexão: será que teriam outra opção acessível às suas possibilidades materiais e financeiras? Será que optam conscientemente por se expor a catástrofes muitas vezes fatais? Será que dispõem das necessárias informações, do claro conhecimento do risco a que estão sujeitos?

Há, porém, algo mais a ser analisado: uma vez instaladas essas moradias, que abrigam muitas vezes famílias numerosas em casas precárias, porque não foram tomadas as devidas e imprescindíveis medidas pelas autoridades competentes (ou incompetentes!) para a contenção de encostas, constantes dragagens de rios e riachos, revisão e limpeza de canais e dutos de escoamento e até remoção dessas famílias para locais seguros? Muito provavelmente técnicos especializados nesses problemas puderam perceber por meio de seus estudos e análises o grave risco desses locais – e, em alguns casos, até notificaram tais avaliações aos respectivos órgãos responsáveis pela tomada das necessárias medidas correspondentes.

No Livro dos Espíritos, o capítulo referente à Lei de Destruição, ao tratar dos Flagelos Destruidores, apresenta claramente observações para nossa reflexão. Na q.739 (1) Kardec pergunta se esses flagelos destruidores têm alguma utilidade do ponto de vista físico, malgrado os males que ocasionam; e a resposta é que “sim, eles modificam algumas vezes o estado de uma região, mas o bem que deles resulta não é geralmente sentido senão pelas gerações futuras”. Na q.740 (2), tem-se o esclarecimento de que servem também como provas morais e intelectuais.

Mas é na q.741 (3) que temos material para sérias reflexões, quando Kardec pergunta se é possível ao homem conjurar (prever, evitar, minorar) tais flagelos e a resposta nos atinge em cheio: “Sim, em parte, mas não como geralmente se pensa. Muitos flagelos são a consequência de sua própria imprevidência; à medida que adquire conhecimentos e experiências pode conjurá-los, quer dizer preveni-los, se souber pesquisar-lhes as causas”. Está ainda aí afirmado que entre esses flagelos há os que são de natureza geral e que estão na ordem natural das coisas – mas ainda que os males por eles causados são geralmente agravados pela indolência do homem!

Mais uma vez essa doutrina da razão, da lógica e do bom-senso nos alerta quanto à nossa responsabilidade, quanto ao fato de não podermos delegar tudo à lei de causa e efeito, não podermos atribuir tudo “aos desígnios de Deus”... Estamos encarnados e reencarnados neste mundo com faculdades e possibilidades para cumprir com nossas atribuições e atividades no sentido de promover o nosso progresso e o progresso intelectual, moral e social da coletividade em que estamos inseridos, bem como trabalhar para a melhoria das condições e situações do mundo físico – a fuga às nossas responsabilidades, a omissão, sejam umas e outra quais forem, é pesado compromisso consciencial, que se fará sentir mais cedo ou mais tarde, para então nos tornarmos verdadeiramente os “co-partícipes na obra da criação” (4).

 

(1 (1)   – (2) – (3) – (4) O Livro dos Espíritos, qs. 739, 740, 741 e 132.

 

Doris Gandres, atualmente residente em Teresópolis/RJ, é a nova colaboradora do Canteiro de Ideias. Desde 1997 em matérias publicadas em alguns jornais espíritas, tais como Jornal Espírita/SP, Correio Fraterno do ABC, Revista Internacional de Espiritismo, Correio Espírita/RJ e outros.

Seja bem-vinda, Doris!

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