Por Dora Incontri (*)
Às vezes, argumentos não bastam. Números,
fatos, dados objetivos não conseguem abrir caminho na opinião obstinada, que se
cristalizou num dogma. Há uma multidão de pessoas, que estão gritando pela
redução da maioridade penal. Já argumentei, já mostrei números, artigos
interessantes e as pessoas simplesmente não ouvem. Então, estou lançando mão da
poesia. Fiz um apelo ao grande poeta Castro Alves, inflamado pelas causas
sociais, sobretudo a do escravo. Muitas das crianças e adolescentes, que hoje
estão na criminalidade – marginalizadas socialmente, que não tiveram acesso à
educação e aos direitos fundamentais do ser humano – são remanescentes
históricos da escravidão. Para clamar contra a injustiça, poetemos à Castro
Alves!
Que ouço? Reclamam vozes
Rigores e punição
Ventam palavras ferozes
Endurece-se a nação!
Que a cadeia irrevogável
Encarcere o vil bandido
Nada seja perdoável
Brada o povo em alarido!
A mídia esse coro orquestra
Moldando as opiniões!
A demagógica mestra
Que põe na praça os vilões!
Mas quem são os acusados
Por tantos dedos hostis?
Onde estão acobertados
Nesses múltiplos Brasis?
Será aquele que trata
Como escravo um boliviano?
Ou o que infesta de mamata
O Congresso de ano a ano?
Será o que expulsa e que mata
Famílias do Pinheirinho?
Será o que não se retrata
Por torturar num cantinho?
Será talvez o assassino
Da missionária caída?
Ou o que violou um menino
Despedaçando-lhe a vida?
Serão os grandes senhores
De feudos descomunais
De escravidões e de horrores
De tempos coloniais?
Não! Nenhum destes, ó Musa!
Persegue a mídia e a nação!
Nenhum destes que se acusa
Com tanto rigor e agressão!
Querem justiça implacável
Com quem sem justiça nasceu!
Nenhuma lei maleável
A quem nada tem de seu!
Pobre, negro, quem na rua
Teve por casa a calçada,
E sem mãe, de vida nua,
Teve sua alma estuprada!
Aos meninos delinquentes
A punição exemplar!
Eles que ainda sem dentes
Só sabiam apanhar…
Pois apanhem de um padrasto,
Que o pai está na prisão!
Menino, siga o seu rastro,
É o que deseja a nação!
Perpetua-se a violência
Com mais violência e rancor!
Poderá haver decência
Numa nação sem amor?
Meninos querem afeto
Mesmo de armas na mão,
Foi a vida num deserto
Que pôs suas almas no chão!
Ó Musa, chama o poeta
Que cantou a abolição!
E faz que sua voz dileta
Diga por mim: compaixão!
Ao invés de mais cadeias
Que são escolas de crime
Semeemos a mancheias
A educação que redime!
Escolas de liberdade
Em militância no bem!
Justiça, paz, igualdade
Que nada falte a ninguém!
Musas, Deuses, Mestres, Guias!
Poetas de hoje e de além!
Calem-se as vozes sombrias
Cantemos vozes do Bem!
(*) jornalista, educadora e escritora. Suas áreas de atuação são Educação, Filosofia, Espiritualidade, Artes, Espiritismo.
A poesia e os comentários da Profª Dora Incontri marcam a posição necessária deste blog sobre a causa em questão. Fantástico!
ResponderExcluirExcelente... Castro Alves!
ResponderExcluirFalar de poesia, encanta
ResponderExcluirConforta e falta todo o bem
Desperta na alma da gente
um fogo que queima bem quente
Constrói sem ferir a ninguém.
Que a Dori Incontri encontre
Por quase ter-me feito chorar
Mais tempo que a concentre
Na arte de ensinar. Roberto Caldas
Em tempo: Onde se lê FALTA TODO BEM, leia-se FAZ TODO O BEM. Roberto Caldas
ResponderExcluirOh, lá, lá!
ResponderExcluirO Roberto Caldas fazendo valer o seu veio poético;
faz valer a riqueza do Canteiro de Ideias.
Parabéns!