“É pela educação, mais do que pela
instrução,
que se transformará a Humanidade.”
(Allan Kardec)
Por Jorge Luiz (*)
O prof. Herculano Pires na magistral obra “O Centro Espírita” nos adverte que se
os espíritas soubessem realmente quais são as funções e a significação
do Centro Espírita, o Espiritismo seria
o mais importante movimento cultural e espiritual da Terra. Na
obra, o autor realiza de forma profícua estudo sistêmico sobre as origens, seu
sentido e a significação do Centro Espírita no panorama cultural da atualidade.
Em
um primeiro momento parece que todos nós compreendemos as reais funções e o significado
de um centro espírita, até porque qualquer um funda o “seu” centro espírita.
Basta uma rusga aqui; outra acolá; temos uma nova casa espírita. Então seria um
exagero da parte do prof. Herculano Pires? Não, respondo! A tarefa não é tão
fácil como aparenta.
Busquemos
então as definições das palavras função e significação.
Segundo
o dicionário Larousse função é
a série de atribuições de determinado organismo ou entidade. Significação é o sentido
e o valor de uma palavra. É preciso compreender ainda, que o significado
vai além da linguística e engloba fenômenos culturais, signos e conteúdos
mentais - ideias individuais e específicas.
O
nível de entendimento do que seja Espiritismo
vai interferir no significado de centro espírita, consequentemente, nas suas
funções. Por exemplo: o entendimento do Espiritismo
como religião, evoca imediatamente como signo igreja que, influenciado
pelos processos mentais e culturais irá determinar o discurso dos valores que
irão modelar a instituição espírita e as funções por ela demandadas. Se o
significado for de hospital, laboratório, escola, os processos serão idênticos.
Isto se verifica em todo processo que envolve a comunicação.
Em
função destas intercorrências, há a exigência indispensável de conhecimento
absoluto do que é Espiritismo, seus
objetivos, do pensamento de Allan Kardec e estudo permanente das obras básicas.
Sem o atendimento destas exigências não se estrutura uma instituição espírita e
na verdade não se desenvolve Espiritismo,
apenas vã utopia de realizá-lo. Isto é o que mais ocorre.
Observemos
Allan Kardec em “Obras Póstumas” – Constituição do Espiritismo, I: “Unicamente quando tiver desenvolvido todas
as partes em que se desdobra é que formará um todo harmônico, e só então se
poderá julgar do que é o Espiritismo.”
O
Espiritismo desenvolvido em solo brasileiro é uma visão embaçada da verdadeira
doutrina dos Espíritos sistematizada por Allan Kardec.
“Na
Introdução de “O Livro dos Espíritos” o
próprio Kardec acentua: “Ninguém, pois,
se iluda: o estudo do Espiritismo é imenso; interessa a todas as questões da
Metafísica e da ordem social; é um mundo que se abre diante de nós.”
Realizar
a significação e funções do centro espírita no Brasil é uma tarefa árdua e
desafiadora. Vários são os significados já sugeridos ao centro espírita. No
entanto, sendo obra de educação, o principal deles é o de Educandário do Espírito.
Os demais são acessórios. Talvez esteja aqui o motivo principal dos desacertos
no movimento espírita brasileiro.
Em
um país em que a educação é um conjunto vazio na sua equação social, as
perspectivas são sombrias para se implementar tal modelo de instituição.
O
Brasil com o mais produtivo movimento espírita do mundo tem a obrigação
inadiável de gestar a dimensão educacional não só em escolas ou universidades,
mas efetivamente nos centros espíritas. Leiam do que afirmou Hamendras Nat
Barnejee, pesquisador indiano: “Conheço
Kardec e a sua doutrina da reencarnação. Acho que cabe ao Brasil, hoje
impregnado do pensamento de Kardec, uma grande missão no plano educacional.
Há muito que se fazer. A pesquisa científica sobre a reencarnação vem
fortalecer a posição dos brasileiros nesse campo.”(¹)
Alguns nomes
dedicaram atenção especial ao aspecto educacional da Doutrina Espírita. Dentre
eles: Eurípedes Barsanulfo, Anália Franco, J. Herculano Pires, Ney Lobo, Dora
Incontri. No entanto é pouco para se superar a prioridade religiosa que foi
encaminhada no contexto espírita brasileiro.
O interessante é que a
exigência da educação espírita não é de hoje. A prof. Dora Incontri, citando Leopoldo
Machado no opúsculo “O Espiritismo é Obra
de Educação” (1941) onde ele informa
que: “Embora tenha dado, em comissão,
parecer favorabilíssimo às teses que, no último Conselho Federativo, reunido em
1933, na FEB, foram apresentadas, exatamente sobre a mesmíssima premente
necessidade de criarmos educandários espíritas, oito anos já lá vão e nenhum
educandário temos, ainda, nos moldes em análise.” (²)
Oitenta
anos passados e a Federação Espírita Brasileira nada fez, ou melhor, jamais
apoiou ou orientou iniciativas neste sentido, mas apenas priorizou a
assistência social espírita.
Com
raríssimas exceções, o modelo de centro espírita brasileiro ainda é o do século
XIX, quando as necessidades do homem favoreceram as intervenções do
assistencialismo e da terapêutica espírita. Vivemos a era do conhecimento
e o centro espírita deve atender os apelos do homem do terceiro milênio. A
complexidade do mundo exige urgência de um projeto novo de centro espírita.
Embora reconheçamos o valor da terapêutica
espírita e da assistência social espírita, o momento é de priorizar a pedagogia
espírita, e toda a sua dinâmica centrada nos educandos, inspirada na filosofia
espírita da educação, que tem como seu principal paradigma o homem trino.
Os frequentadores de todas as idades em um centro espírita não podem ser
passivos em suas atividades. Devem ser atuantes e participativos. A
participação; os questionamentos levam ao aprendizado. Allan Kardec agiu assim
com as “Vozes dos Céus”. Sócrates,
filósofo grego fazia perguntas para levar o interlocutor a mudar suas posições
e seus pressupostos, mudando seus próprios pensamentos. Esta deve ser a
arquitetura básica do centro espírita.
Na
questão nº 914 de “O Livro dos Espíritos”
respondem à Kardec: “À medida que os
homens se esclarecem sobre as coisas espirituais dão menos valor às materiais;
em seguida, é necessário reformar as instituições humanas, que as entretêm e
excitam. Isso depende da educação.”
Maria
Elisa Hillesheim, pedagoga, com especialização em administração escolar, na
obra “Em torno de Rivail”, sugere um
ponto de partida para a educação, uma filosofia de essência que permeie as
relações pedagógicas. Filosofia entendida – cita George F. Kneller – “a tentativa para pensar do modo mais
genérico e sistemático em tudo o que existe no universo. Pensamento exigido
pela necessidade de o homem organizar suas ideias.” (3) Neste
contexto, prossegue ela, Pestalozzi elabora a sua filosofia, a visão integral
do homem: moral, intelectual e físico. (coração, cabeça e mãos)
Kardec
herda de Pestalozzi esta filosofia e desenvolve com a Doutrina Espírita
todos os requisitos para a solução da filosofia da educação, através da
filosofia espírita da educação.
Cabe
aos espíritas reinventarem o centro espírita como Educandário do Espírito,
presentes os requisitos assinalados.
(1)
INCONTRI,
Dora. Pedagogia Espírita. São Paulo. Editora Comenius. 2004
(2)
idem
(3)
AUTORES
DIVERSOS. Em Torno de Rivail.2004. Editora Lachâtre.
(*) livre-pensador e voluntário do Instituto de Cultura Espírita - ICE.
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