Por Sérgio Aleixo (*)
Roustaing
e seus discípulos ainda não haviam chegado à Era da Razão, porque se mostraram por
demais entusiastas de teorias mirabolantes, vertidas na linguagem prolixa de
Espíritos enganadores, que só fizeram lançá-los às vagas místicas dos tempos
mágicos da antiga Era Mitológica.
Eles
julgavam que textos bíblicos, como os versículos da revelação do anjo a Maria e
depois a José, por exemplo, “não podem e não devem ser recusados”.[1] E por
esta pseudorrazão, para eles, “o que de Maria nasceu se formou por obra do
Espírito Santo”; entendiam que a concepção, a gravidez e o parto “não podiam
ser e não foram reais”, mas “apenas aparentes”, porque, “se reais tivessem
sido, estaríamos em presença de um fato contrário às leis naturais que presidem
à geração dos corpos no seio da humanidade terrena”.[2]
Bem
se vê a opção do misticismo roustainguista: desumanizar o Cristo, “coisificar”
Jesus (“o que” de Maria nasceu). Roustaing e seus discípulos, pois, rejeitaram
a ordem natural biológica, criada por Deus e atestada pela Ciência, em favor da
infalibilidade das Escrituras, dogma humano. Não surpreende que tenham a
concepção delirante de que, até que se verifique a chegada de um certo
“Espírito Regenerador”, bem como sua influência sobre o Papa, os médiuns
“obterão somente fatos isolados, estranhos à ordem comum dos fatos”.[3]
Ao
oposto da racionalidade do Espiritismo, a “escola” de Roustaing acredita que,
por estar escrito na Bíblia, um texto possui valor de dogma, abrigando
necessariamente um suposto significado espiritual. Seria o caso das palavras
bíblicas que dizem não ter Jesus pai, ou mãe, ou mesmo genealogia.[4]
Evidentemente, foram escritas numa preocupação com a tese do pecado original.
Como subtrair Jesus a uma tal maldição? Negar-lhe a genealogia, a natureza biológica.
Acreditando
que se empenhava em autenticar o texto evangélico, Roustaing afirmou que a influência
“magneto-espírita” produziu “ilusão completa na mulher virgem e em todos os que
testemunharam o fato”, ou seja, que “a concepção, a gravidez, o parto podem ser
imitados”.[5] O magnetizador, segundo ele, foi o próprio Jesus, que “se serviu
da faculdade mediúnica da Virgem Maria para, fluidicamente, simular nela a
gravidez”; e esta ideia absurda foi justificada — pasmem — pela necessidade de
o Messias vir ao planeta Terra “respeitando as tradições e os preconceitos da
nação judaica”.[6]
Então,
diziam Roustaing e seus discípulos que “Jesus Cristo não foi um homem carnal, revestido
de um corpo material humano, qual o do homem terreno, sujeito como este à morte;
não, ele não morreu efetivamente no Gólgota”.[7]
Ensinavam
estas excrescências e depois acusavam Kardec e os espíritas de ser-lhes “indispensável
um Jesus sangrento, choroso, gemebundo, andrajoso e ofegante”; invertendo a ordem
natural, a “escola” de Roustaing afiançava que “há dois mil anos o populacho e
os crentes tudo sacrificam para gozar desse espetáculo fictício e legendário,
mas que para um e outros é real”; e decretava que “o Cristo, natureza superior,
não podia sofrer segundo o nosso modo de entender material e terra a terra, eis
o que, daqui por diante, devemos aceitar como verdade”. [8]
Herdeiros
do melhor do Iluminismo, acostumados à análise crítica e ao raciocínio lógico naturalista
de Allan Kardec e de seus elevados Protetores, os espíritas deveriam preferir, segundo
os rustenistas, a impostura à verdade; deveriam considerar como realidade
histórica a mal-acabada reedição de um simples mito delirante concebido por
longínqua seita gnóstica.
Aliás,
risível é que se diga no opúsculo rustenista que “a tradição mais bela e
generosa é a que nos legaram os grandes missionários da humanidade,
sacrificando suas vidas”,[9] pois o rustenismo nega o sacrifício do maior de
todos estes missionários ao dizer que
Jesus “não morreu efetivamente”; que, neste sentido, tudo não passou de “um
espetáculo fictício e legendário”, destinado a entreter “o populacho e os
crentes”. Tática semelhante à do ladrão astuto que grita: “Pega ladrão!”.
(*) escritor, expositor e pesquisador espírita.
[1] Os Quatro Evangelhos. Prefácio. F.E.B., 1920, p. 58.
[2] Os Quatro Evangelhos. Prefácio. F.E.B., 1920, p. 59.
[3] Os Quatro Evangelhos. Vol. III, n. 196, F.E.B., 5.ª
ed., 1971, pp. 65-66.
[4] Hebreus 7:3.
[5] Os Quatro Evangelhos. Prefácio. F.E.B., 1920, p. 55.
[6] Os Quatro Evangelhos. Prefácio. F.E.B., 1920, p. 61.
[7] Os Quatro Evangelhos. Prefácio. F.E.B., 1920, p. 59.
[8] Os Quatro Evangelhos. Prefácio. F.E.B., 1920, p. 68.
[9]
Os Quatro Evangelhos. Prefácio. F.E.B., 1920, p. 76.
Ótimo Texto.
ResponderExcluirNonatoCEABEM
INACREDITÁVEL QUE A EDITORA DA FEB (OU A PRÓPRIA FEDERAÇÃO) CONTINUE A PRODUZIR ESSE LIXO ESPIRITUAL. ESSA OBRA DEVERIA SER PUBLICADA(PORQUE TODOS TEM DIREITO DE DIZER O QUE QUISER) POR ALGUMA ENTIDADE QUE COMBATESSE AO ESPIRITISMO, NÃO O REPRESENTASSE. Roberto Caldas
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