"Não
verás, nesta existência, senão a aurora do sucesso de tua obra; será necessário
que retornes, reencarnado num outro corpo, para completar o que tiveres
começado, e, então, terás a satisfação de ver, em plena frutificação, a semente
que tiveres difundido sobre a Terra." (Espírito Zéfiro)
Por Jorge Luiz (*)
Além da mensagem do Espírito Zéfiro afirmando a necessidade do retorno de
Allan Kardec, existe outra do Espírito da Verdade, intitulada “Meu Retorno”, publicada
em Obras Póstumas, reproduzida a
seguir:
Prossegui o caminho sem medo, e se ele
está semeado de espinhos, asseguro-te que terás grandes satisfações antes de
retornares "por um pouco" entre nós.
P. Que entendeis por essas palavras
"por um pouco"?
R. Não ficarás muito tempo entre nós; é
necessário que retornes para terminar a tua missão, que não pode ser rematada
nesta existência. Se isso fosse possível, não te irias daí de modo algum, mas é
preciso suportar a lei da Natureza.
Estarás ausente durante alguns anos e,
quando voltares, isso será em condições que te permitirão trabalhar cedo. No
entanto, há trabalhos nos quais é útil que termines antes de partir; é porque
te deixaremos o tempo necessário para acabá-los.
Faz 146 anos de
sua desencarnação. Nas últimas décadas, desconhecidos e conhecidos do movimento
espírita se autoproclamaram ser a reencarnação de Allan Kardec, como são os
casos, apenas para ilustrar, de Alziro Zarur (1914-1979), presidente da Legião
da Boa Vontade (LBV) e Osvaldo Polidoro (1910-2000), um dos fundadores da
Federação Espírita do Estado de São Paulo, criador do Divinismo e autor de mais de uma centena de obras.
Diversas correntes de
espíritas, entretanto, afirmam que Francisco Cândido Xavier é a reencarnação de
Allan Kardec, se bem que esse nunca chegou a confirmar, muito pelo contrário,
negava peremptoriamente. A professora Dora Incontri escreveu um belíssimo
artigo a esse respeito - “Chico Xavier
não é Kardec” -, publicado nesse espaço.(leia)
Tudo isso surge devido às conclusões
de Allan Kardec, colocada em forma de “nota” no final da mensagem do Espírito
da Verdade, que esse retorno dar-se-ia por volta do final do século XIX e
início do século XX. É preciso admitir que Kardec
analisou a questão temporal no curso da matéria, que é muito diferente da
eternidade que é a dimensão do Espírito.
Não há relevância em se
discutir tais questões, afinal, ficar-se-á somente em especulações. Entretanto,
ficam duas perguntas: por que os espíritas brasileiros são convictos de que
Kardec tem necessariamente que reencarnar no Brasil? Será que só pelo simples
fato de o Brasil deter hoje o maior número de espíritas do Planeta? Deste ponto
nascem reflexões!
O que é relevante na
mensagem do Espírito da Verdade é a necessidade de a obra ser complementada.
Para que isso ocorresse, far-se-ia necessário que o Espiritismo estivesse
trilhado as etapas definidas por Kardec universalmente. Não há motivos para ele
reencarnar aqui e em nenhum outro País, ao se considerar o desejo do Espírito
da Verdade.
A professora Dora Incontri
fortalece mais esse pensamento, no artigo citado logo a seguir, onde ela
conclui:
(...) É por isso que meu trabalho tem
sido no sentido de resgatar Kardec e seus antecessores diretos: Comenius,
Rousseau, Pestalozzi – todas personalidades de vanguarda, com pensamento social
avançado, com projetos libertários de Educação. É desse caldo cultural que
nasceu o Espiritismo. (...)
(...) E essa raiz é representada por
Kardec, que por todas as razões vistas e muitas outras que não é possível
comentar aqui, não reencarnou como Chico, não reencarnou ainda, porque teríamos
de reconhecê-lo por sua mente poderosa, por sua liderança equilibrada e segura
e por trazer uma contribuição muito melhor que a de Chico e mesmo melhor que a
do próprio Kardec, pois senão não haveria razão para reencarnar-se.
O Espiritismo hoje está
presente em mais de 30 países, em sua maioria, através de iniciativas da
Federação Espírita Brasileira (FEB), da Associação Médico-Espírita do Brasil
(AME-BRASIL) e do médium e tribuno baiano Divaldo Franco. Indiscutivelmente, há
uma tendência de brasilinialização do
movimento espírita internacional. Bom ou ruim? São três formas bem distintas de
transnacionalização do Espiritismo.
Federação
Espírita Brasileira (FEB)
Apesar da hegemonia que o
movimento espírita brasileiro goza, a dinâmica federativa implementada pela FEB,
a sua organização e funcionamento das casas espíritas não a legitimam no
contexto desse movimento, o que tem gerado críticas e discussões. Apesar desse
cenário, é desse modelo que os outros países dependem para construção de uma
identidade e se afirmarem “universais”.
É preciso entender que a
experiência histórica do Espiritismo no Brasil, via FEB, é um caldo sincrético,
que resultou em um religiosismo igrejeiro, nascido do rustanismo-católico instituído por Dr. Bezerra de Menezes, quando
do seu segundo mandato como presidente da FEB. O tríplice aspecto, emblemático
no triângulo de Emmanuel – ciência, filosofia e religião -, atropelou a
Doutrina Filosófica-Moral de Kardec, fazendo prevalecer o Espiritismo como uma
nova religião cristã, sepultando a sua força
primordial que é o aspecto
filosófico, como afirma Allan Kardec em O
Livro dos Espíritos. Para um país sem tradição científica-filosófica, foi
fácil adaptar o Espiritismo como religião.
A tradição
científica-filosófica e pedagógica, somente alcançada por alguns pensadores
espíritas, é que subverte essa ordem, e que pode ser o prenúncio de novos tempos.
É dessa heterogeneidade de ordem interna, fruto da falta da unidade de
princípios, que também surgem de ordem externas, resultando resistências de
alguns países em acolher totalmente o modelo febiano, como é o caso específico da França, como afirma Berard
Lewgoy¹ em seu estudo “A
Transnacionalização do Espiritismo Kardecista Brasileiro: Uma Discussão Inicial”:
É mister indicar que se trata do Espiritismo
mais cioso da manutenção de uma independência em relação ao Espiritismo
brasileiro, perceptível pela tímida introdução da bibliografia brasileira nos
documentos, jornais e sites do movimento.
Associação
Médico-Espírita do Brasil (AME-BRASIL)
Apoiada no paradigma
médico-espírita, a AME-Brasil, em parceria com a AME-Internacional, divulgam o
Espiritismo no contexto medicina-espiritualidade, realizando vários congressos,
seminários, entrevistas, livros, pesquisas, projetando estratégias de
restruturação e validação do movimento espírita, e, consequentemente, o
Espiritismo, pela via da credibilidade acadêmica.
Portanto, a AME-Brasil
através de um discurso científico-psicológico, associado às teorias espíritas
das doenças, distancia-se da identitária religiosa-igrejeira do movimento
espírita brasileiro, até por exigências das coordenações de eventos das
espécies no exterior, o que sinaliza novos caminhos para o Espiritismo.
Divaldo
Franco
Divaldo Franco tem sido
fundamental para a construção de redes espíritas no exterior entre brasileiros
e estrangeiros. A divulgação realizada pelo médium e tribuno baiano, Divaldo
Franco, é centrada no carisma do médium, aliada à vasta obra psicografada por
ele. É conhecido por “Paulo de Tarso do Espiritismo”. Ao contrário do Brasil,
afirma Lewgoy:
Os franceses que escrevem livros
espíritas são pesquisadores que abordam temas e não médiuns que psicografam
mensagens de grandes personagens ou romances, como é comum entre os
brasileiros, a despeito da grande importância da psicografia na história do Espiritismo
francês.
Divaldo tem como hábito
fortalecer as posições federativas estaduais e nacional. No exterior, ele
expressa esse mesmo paradigma, apoiando o caráter expansionista da FEB,
articulando uma brasilianização do
Espiritismo, sem a perda identitária com Allan Kardec.
O movimento espírita como um
todo, portanto, encontra-se em uma encruzilhada: se existe uma França que zela
pela sua autoctonia, tem-se um movimento espírita internacional que concorda,
embora de maneira tácita, com a hegemonia brasileira.
Não será provável que se esteja
transitando o período considerado de intermediário, que Allan Kardec afirma que
na época própria receberia denominação característica? A comprovação da
reencarnação como Lei Biológica, dentro do primado da consciência, esse período
poderá se chamar de período científico, consolidando o Espiritismo como ciência
do Espírito, inaugurando a cultura espírita, fundamental para a transformação
moral da Humanidade, como afirma o Dr. Décio Iandoli Júnior, em sua obra A Reencarnação como Lei Biológica:
Poderíamos apresentar duas categorias
principais de mudanças decorrentes da aceitação da reencarnação como lei
biológica: modificações conceituais e estruturais das ciências da vida e
mudanças filosóficas e morais.
A conclusão de Iandoli é de
fundamental importância para entendermos Allan Kardec, quando afirma em “A Gênese”, no capítulo XVIII, Sinais dos Tempos:
Não é o Espiritismo que cria a
renovação social, é a madureza da humanidade que faz de tal renovação uma
necessidade.
Diante desse cenário, embora
se mostre necessária, Kardec dificilmente reencarnará, pelo menos até que se
cumpra a profecia do Espírito Massilon, em a Revista Espírita, de abril de
1861:
(...)
Esta criança não tem pátria; percorre toda a Terra, procurando o povo que há de
ser o primeiro a arvorar a sua bandeira, e esse povo será o mais poderoso entre
os povos, pois tal é a vontade de Deus.
(¹ ) Bernard Lewgoy possui graduação em
Filosofia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS, mestrado em
Antropologia Social pela mesma universidade e doutorado em Ciência Social pela
Universidade de São Paulo – USP. É professor do Programa de Pós-Graduação em Antropologia
Social da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. É vice-presidente da
Câmara de Pesquisa da UFRGS, membro do Conselho Deliberativo do Instituto
Latino Americano de Estudos Avançados dessa instituição e membro do Núcleo de
Estudos da Religião. É especialista em espiritismo e autor, entre outros, de O
Grande Mediador. Chico Xavier e a cultura brasileira (Bauru: EDUSC -
PRONEX/CNPQ/Movimentos Religiosos no Mundo Contemporâneo, 2004).
Referências
IANDOLI
JÚNIOR, Décio. A reencarnação como lei
biológica. São Paulo: FE ED. Jornalística, 2004.
INCONTRI,
Dora. Chico Xavier não é Kardec. Canteiro
de Ideias. Fortaleza, 2012.
KARDEC,
Allan. Obras póstumas. 13.
ed. Rio de Janeiro: FEB, 1973.
KARDEC,
Allan. O livro dos Espíritos.
Rio de Janeiro: FEB, 1994.
KARDEC,
Allan, A gênese. Rio de Janeiro. FEB. 2010.
LEWGOY,
Bernardo. A transnacionalização do Espiritismo kardecista brasileiro: uma
discussão inicial. Religião &
Sociedade (Impresso), v. 28, p. 84-104, 2008.
_______. Revista espírita 1861. Araras, SP: IDE, 1999.
(*) blogueiro e expositor espírita.
Meu Caro Jorge, Excelente maneira de homenagear o Codificador da Doutrina Espírita. Penso na mesma direção que apontas em teu artigo, se aqui no Brasil onde, supostamente, a Doutrina encontrou terreno mais fértil e acabou acontecendo o que retratas em teu texto, imagine em outras partes do mundo! Parabéns! Belo trabalho!
ResponderExcluirCaro amigo,
ResponderExcluirGrato pelas palavras de estímulo. Há a necessidade urgente de reconstruirmos o movimento espírita brasileiro pois corremos o risco de se perder a identidade espírita, diante dos atalhos e desvios que ele trilha. Levantarmos discussões é salutar para esse intento.
Abraços
O retorno de Kardec, se é ou não coincidência, foi lançado neste fim de mês de Junho, o livro, "A PROVA QUE DEUS EXISTE COM BASE CIENTÍFICA" na Livraria "LEITURA" do BH Shopping, em Belo Horizonte. É o primeiro livro de uma trilogia, marcando o retorno á fisicalidade de Kardec, que veio completar o que faltava ainda ele fazer. Pois sabemos que Kardec, através do fenômeno das mesas girantes, provou a existência dos Espíritos, mas faltava ele provar, pela ciência, a existência de Deus.
ResponderExcluirAgora ficou muito claro, principalmente, para nós Espíritas, o que era que faltou a Kardec fazer, e o porquê ele teria que retornar!
"Não verás, nesta existência, senão a aurora do sucesso de tua obra; será necessário que retornes, reencarnado num outro corpo, para completar o que tiveres começado, e, então, terás a satisfação de ver, em plena frutificação, a semente que tiveres difundido sobre a Terra." (Espírito Zéfiro)
Além da mensagem do Espírito Zéfiro afirmando a necessidade do retorno de Allan Kardec, existe outra do Espírito da Verdade, intitulada “Meu Retorno”, publicada em Obras Póstumas, reproduzida a seguir:
Prossegui o caminho sem medo, e se ele está semeado de espinhos, asseguro-te que terás grandes satisfações antes de retornares "por um pouco" entre nós.
P. Que entendeis por essas palavras "por um pouco"?
R. Não ficarás muito tempo entre nós; é necessário que retornes para terminar a tua missão, que não pode ser rematada nesta existência. Se isso fosse possível, não te irias daí de modo algum, mas é preciso suportar a lei da Natureza.
Estarás ausente durante alguns anos e, quando voltares, isso será em condições que te permitirão trabalhar cedo. No entanto, há trabalhos nos quais é útil que termines antes de partir; é porque te deixaremos o tempo necessário para acabá-los.