Por Alkíndar de Oliveira (*)
Ainda não li Roustaing. Portanto, não tenho
opinião formada sobre sua mensagem espírita. Mas no momento o que mais me
intriga em relação a Roustaing, é que estão procurando impedir aos espíritas o
direito de conhecê-lo. Antes de comentar este fato, permita-me o leitor que
eventualmente seja totalmente leigo em Roustaing, informar-lhe o que sei sobre
este espírita da época de Kardec.
O francês Jean-Baptiste Roustaing foi espírita
da primeira geração. Contemporâneo de Kardec, tornou-se espírita estudando as
obras de Kardec e mantendo correspondência com o próprio.
Assim como Kardec teve por missão codificar
as obras básicas, Roustaing também deu a sua contribuição ao Espiritismo. Coube
a ele a missão de organizar, através de mensagens dos espíritos, o livro “Os Quatro Evangelhos”, que enfoca o
lado religioso do Espiritismo. O conteúdo desse livro compreende comentários
(dos espíritos, repito) sobre os textos dos quatro evangelistas. Portanto, é um
livro mediúnico.
Sei muito pouco sobre Roustaing. Talvez, caro
leitor, você questione: Por que se envolver então com o polêmico tema Roustaing?
Minha resposta: Entusiasmei-me em conhecê-lo
quando soube que grandes oradores espíritas da atualidade têm no “Os Quatro Evangelhos” importante fonte
de pesquisa e estudo.
Fiquei também intrigado ao saber, de fontes
fidedignas, que estes grandes e admirados oradores espíritas que leem e estudam
Roustaing, se veem quase que obrigados a esconder tal fato. Pois, se assim o
fizessem, seriam proibidos de proferir palestras em várias Instituições
Espíritas!!! Todo este mistério levou a interessar-me e a pesquisar a vida de
Roustaing. Com este objetivo, li dois livros que contam sua vida de espírita.
Soube que o seu livro foi editado pela FEB –
Federação Espírita Brasileira. Soube ainda que há tempos existem dois grupos
dentro da FEB que têm opiniões diametralmente opostas sobre a importância d’Os Quatro Evangelhos para o Espiritismo.
Um grupo o coloca num importante patamar; outro o despreza. Ambos os grupos
sabem que em nenhum momento Roustaing se viu como um ser mais importante do que
Kardec para o movimento espírita. O que é um bom sinal. Aliás, Roustaing via
Kardec como “o mestre”.
Esta rivalidade dentro da FEB fez com que a
obra de Roustaing não tivesse a divulgação ou a exposição que os demais livros
espíritas têm.
Antes de qualquer pré-julgamento do leitor,
esclareço que valorizo a organização e o trabalho da FEB, pois, não obstante
todos os percalços do caminho, geralmente à frente dessa honrada instituição
estiveram e estão homens sérios que querem o bem de nossa Doutrina. Obviamente,
como ocorre com a maioria das instituições, em sua trajetória esses líderes do
passado e do presente acertaram muito e erraram muito. O que é próprio de quem
muito faz.
Agora retorno ao tema inicial deste texto:
estão procurando impedir os espíritas de conhecer Roustaing. A seguir explico o
porquê dessa minha conclusão.
Pelos motivos acima expostos interessei-me em
ler e estudar Os Quatro Evangelhos. Como resido em São Paulo-SP, procurei-o nas
principais livrarias espíritas desta capital. Não o encontrei. Não o encontrei
nem mesmo na livraria da FEESP - Federação Espírita do Estado de São Paulo. E
nesta citada livraria tive uma infeliz surpresa: O Os Quatro Evangelhos não
está presente tão somente nas bancas da livraria, esta obra também não está
presente no catálogo de livros da instituição!
Todos nós sabemos que uma coisa é faltar
livros nos estandes; outra bem diferente é o livro não constar da lista do
catálogo da livraria!
Será que está havendo censura prévia no
movimento espírita? Será que as Instituições Espíritas representativas estão
querendo nos dizer que livros podemos, ou não, ler?
Depois de procurar e não encontrar o citado
livro, amigos informaram-me que (utilizando-me da expressão de um deles) “deram
um chá de sumiço em Roustaing”. E me explicaram qual é um dos “fortes motivos”
para esta ocorrência: Roustaing diz no seu livro que Jesus, quando na Terra,
tinha corpo fluídico. Eu, que prefiro preocupar-me mais com a mensagem de Jesus
do que circunstâncias outras, pergunto-me: E daí? Será que este erro, ou este
acerto, pode fazer com que nos impeçam de ler uma obra que grandes espíritas
reforçam sua importância e qualidade?
Será que podemos deixar de lado o que sempre
aprendemos em nossa doutrina: Examinai tudo, retende o que é bom...
Por que não deixar para nós, leitores, a
decisão que nos aprouver?
No consagrado livro “Brasil Coração do Mundo, Pátria do Evangelho”, editado pela FEB,
psicografia de Chico Xavier, o espírito Humberto de Campos reforça a
importância de Roustang para o Espiritismo. Escreveu o espírito Humberto de
Campos: “(...) Segundo os planos de trabalho do mundo invisível o grande
missionário (Allan Kardec), no seu maravilhoso esforço de síntese, contaria com
a cooperação de uma plêiade de auxiliares de sua obra, designados
particularmente para coadjuvá-lo, nas individualidades de Jean-Baptiste
Roustaing, que organizaria o trabalho da fé; de Léon Denis, que efetuaria o
desdobramento filosófico; de Gabriel Delanne, que apresentaria a estrada
científica e de Camile Flammarion, que abriria a cortina dos mundos, desenhando
as maravilhas das paisagens celestes, cooperando assim na codificação
kardequiana no Velho Mundo e dilatando-a com os necessários complementos.”
Se assim é, como diz o espírito Humberto de
Campos, por que as instituições espíritas aceitam e valorizam as contribuições
de Leon Denis, Gabriel Delanne e Camile Flammarion, mas colocam restrições
justamente naquele que teve como foco o que mais precisamos para educar nossos
sentimentos, que é a fé?
Kardec nos ensinou que o verdadeiro espírita
é um Livre Pensador. Óbvio que com esta denominação, o mestre Kardec quis
deixar para o futuro a mensagem de que não cabe às instituições espíritas ditar
regras de conduta. E ponto final.
Mas continuemos...
Kardec leu o Os Quatro Evangelhos e, na Revista Espírita de junho de 1.866, fez
o seguinte comentário: “Esta obra
compreende a explicação e a interpretação dos Evangelhos, artigo por artigo,
com a ajuda de comunicações ditadas pelos Espíritos. É um trabalho considerável
e que tem, para os Espíritas, o mérito de não estar em nenhum ponto, em
contradição com a doutrina ensinada pelo ‘O Livros dos Espíritos’ e ‘O Livro
dos Médiuns”.
Com seu espírito crítico e racional, Kardec
reforça a sintonia do conteúdo do livro com as obras da codificação. Em parte
do seu texto, Kardec faz críticas em alguns pontos do livro mencionado. Por
exemplo, Kardec critica o caso do corpo fluídico de Jesus, bem como a forma da
elaboração do livro. Mas sem desmerecer a importância da obra, Kardec reforça: “Estas observações, subordinadas à sanção do
futuro, em nada diminuem a importância da obra que, ao lado de coisas
duvidosas, em nosso ponto de vista, encerra outras incontestavelmente boas e
verdadeiras, e será consultada pelos Espíritas Sérios”.
Percebeu, caro leitor, que Kardec disse que Os Quatro Evangelhos traz informações
“incontestavelmente boas e verdadeiras, e será consultada pelos Espíritas
Sérios”. Por que então determinadas instituições espíritas estão estimulando
estes espíritas sérios consultarem este livro às escondidas para, sensatamente,
evitar o “caça às bruxas”?
Meus amigos, devemos em todas as áreas, e
principalmente na área espírita que militamos, evitar críticas baseadas somente
em evidências. Pois existem evidências que o tempo comprovam não serem
verdadeiras. Nossas críticas para serem válidas, precisam ser sustentadas no
tripé:
“Fatos”;
Devem “visar o bem comum”;
E precisam ser de “caráter construtivo”.
A crítica que ora faço às instituições
citadas, é baseada neste tripé. Isto é, é baseada em:
a)
Fatos
A crítica que faço não tem por base
“evidências”. Pois é fato de que no catálogo da livraria da FEESP - Federação
Espírita do Estado de São Paulo não consta o citado livro de Roustang; bem como
é fato de que a FEB - Federação Espírita Brasileira cria impedimentos para que
o citado livro seja conhecido pelos espíritas.
b)
Visa o bem comum
Minha crítica é um incentivo ao conhecimento.
Pois a proibição, ou quase proibição de uma obra, além de cercear a liberdade
de opção, prejudica a tão necessária análise comparativa tão utilizada por
Kardec (quando da elaboração das obras básicas). Pois, se lermos Roustaing,
teremos como comparar sua mensagem com o conhecimento que o Espiritismo nos
proporcionou.
c)
Caráter construtivo
A pergunta que precisa ser respondida é: por
que desconhecermos uma obra em que o próprio Kardec ressalta que traz
informações “incontestavelmente boas e verdadeiras, e será consultada pelos
Espíritas Sérios”?
A respeitável médium Ivone A. Pereira, logo
nas primeiras páginas do seu livro Devassando o Invisível (Editora FEB), diz: “(...) se é dever de qualquer cidadão
respeitar opiniões alheias, ao espírita, com muito maior razão, assistirá o
dever de consideração à opinião do próximo, ainda quanto antagônica ao seu modo
de pensar.” Em outras palavras, esta notável médium nos orienta e nos
alerta sobre a importância da fraternidade entre nós espíritas. Que surjam as
críticas construtivas, pois que este era também o interesse de Kardec, mas que
de forma conjunta à crítica, esteja o nosso respeito às essas duas instituições
que são para o Brasil – e até para o mundo – importante base da divulgação
espírita. Vê-se na FEB e na FEESP a presença de incansáveis trabalhadores, que
visam o bem do próximo. Vê-se, nestas instituições, a presença de pessoas que
dedicam suas vidas a esta causa maravilhosa que é o Espiritismo. Vê-se, nestas
instituições, trabalho profícuo carregado de amor e de desinteresse pessoal.
Não obstante as eventuais críticas que estas instituições recebem (o que é
normal e próprio em entidades representativas), a grande questão é: Será que o Espiritismo teria conseguido
chegar onde tão bem chegou sem a forte contribuição da FEB e de suas
representantes estaduais? Certo, de que há muito, muito e muito por fazer.
Mas as bases fortes que existem, devemo-las em grande parte a estas importantes
instituições.
Um adendo: Eu disse logo acima: “onde (o
Espiritismo) tão bem chegou”. Esta afirmação pode gerar o seguinte e natural
questionamento: “Mas, o Espiritismo com
tão poucos adeptos, já chegou a um bom lugar no panorama mundial das
religiões?” Não, todos sabemos que não. No entanto, comparando a “idade” do
Espiritismo com as “idades” do Catolicismo e do Protestantismo, o caminho que
percorremos é altamente significativo.
Mas, voltando ao nosso tema, faço aqui um
apelo ao editor d’Os Quatro Evangelhos: Não nos impeça de comprarmos esse
livro. Deixe-nos conhecer e estudar Roustaing para que possamos tirar nossas
próprias conclusões. Deixe-nos sermos “Espíritas-Livres Pensadores”, como
preconizou Kardec.
Caro leitor, conforme está claro em toda a
extensão deste texto, meu objetivo não é colocar-me contra ou a favor do
conteúdo do livro Os Quatro Evangelhos. Pois, como poderia posicionar-me em
relação a algo que não conheço?
Posiciono-me sim, sobre o direito que temos
de conhecer um livro que Kardec (repito pela terceira vez), ao mesmo tempo em
que criticou parcialmente o seu conteúdo, mencionou que a obra de Roustaing
“(...) traz informações “incontestavelmente boas e verdadeiras, e será
consultada pelos Espíritas Sérios”.
(*) consultor de empresas, conferencista e
professor de comunicação verbal, criador do método Autoestima em Alta. Fundador
da Escola de Líderes, de Oratória e de Vendas, ministra aulas e seminários. É
especialista em treinamento e consultoria empresarial nas áreas do
comportamento, comunicação, motivação, criatividade e liderança. Palestrante e autor de várias obras espíritas.
O artigo do prof. Alkíndar é merecedor de boa análise, pois acima de tudo, expressa a ideia dele, particularmente. Entretanto, sugiro a leitura da obra "O Verbo e a Carne", de Júlio Abreu Filho e José Herculano Pires.
ResponderExcluirAo confrade Alkindar, nesta empreitada de ler (e de terminar), a obra ditada apenas a Emilie Colignon, sugiro armar-se de dose extra de paciencia. Creio que o amigo notará grande diferenca dos textos selecionados por Kardec dentre os inúmeros ditados a muitos médiuns e que, pacificadas por ele sob a supervisão do Espírito de Verdade, sobraram para comporem o legado do mestre lionês.
ResponderExcluirÉ importante nessa rica discussão que não se confunda alhos com bugalhos: a discussão a respeito da FEB e FEESP é outro capítulo e concordo em forma e gênero com o autor do texto. Quanto à obra de Roustaing também não concordaria com a proibição da leitura, até pelo próprio exercício da liberdade que deve nortear os passos das pessoas, espíritas ou não. Pessoalmente não concordo que se incentive tal leitura, seja pela crítica ácida ou pela defesa inocente, ambas abrem holofotes sobre informações que escondem verdadeiras armadilhas que não se resumem à naturza do corpo de Jesus, pois isso NÃO TEM A MENOR IMPORTÂNCIA por se tratar de uma teoria pueril e desaprovada pela ciência. Na minha opinião o grave se encontra na Teoria dos Anjos, Evolução em Linha Reta, Involução . Reitero a recomendação do companheiro Jorge Luiz. Roberto Caldas
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