Por Jorge Daher (*)
Símbolo chinês da longevidade |
O Hotel de Dieu, em Paris, é considerado o
mais antigo hospital de todo o mundo, sua construção teve início no século VII
de nossa era. No início do primeiro milênio da era cristã, a descrição do
hospital era de um depósito de doentes condenados à morte pela imundície do
local e por ser depósito de indigentes já acostumados com a sujeira e o mal
cheiro. Os quartos eram escuros, de pouquíssima ventilação e o ar pestilencial
tinha o peso da náusea que causava aos estômagos mais sensíveis.
Na
mesma época, o primeiro milênio da cristandade, o hospital de Ispahan, na
Pérsia, idealizado e dirigido pelo Príncipe dos Médicos, Ibn Sina, latinizado
para Avicena, foi descrito como de ambiente arejado, com amplas janelas que
recebiam a luz do forte sol do berço da Humanidade. Avicena, um polímato que
escreveu a enciclopédia médica A Arte da Cura, além de mais de 200 obras de
filosofia, exigia extrema limpeza do ambiente, aromatização contínua das
grandes enfermarias com incensos de rosas e essências raras, camas limpas e
cuidados ostensivos aos doentes, mantendo-os limpos.
Os
índices de mortalidade no hospital persa eram muito menores que os do Hotel de
Dieu e somente pela descrição dos dois nosocômios já identificamos a causa da
diferença.
Hoje
vivemos uma época em que atribuímos aos recursos da Medicina o aumento da
longevidade, em um falseamento da realidade. Uma das causas do aumento da
longevidade deve-se a medidas sanitárias e redução da mortalidade infantil
(Lewontin, R. C., & Lewontin, R. C. (2000). The triple helix: Gene, organism, and environment.
Cambridge, Mass: Harvard University Press.).
As grandes endemias que
afetaram fortemente as populações foram controladas através de medidas
sanitárias. Na Europa, a drenagem de esgotos e ações de isolamento e vigilância
limitaram o avanço da tuberculose antes mesmo dos tratamentos quimioterápicos.
O mesmo ocorreu com a sífilis.
Com
as epidemias não foi diferente, medidas sanitárias limitaram o avanço dos males
conhecidos por pragas, e, com a descoberta das vacinas, a erradicação de muitas
doenças foi possível. Se hoje vivemos epidemia de dengue e Chicungunya é porque
as medidas sanitárias e higiênicas não recebem devida atenção por parte de
governantes e da população.
Outro
fator para aumento da longevidade é a redução da mortalidade em todas as faixas
etárias, mas este fenômeno é recente, conquistado após a Segunda Guerra. Mais
uma vez, atribuir ao avanço da farmacoterapia e dos recursos médicos o motivo
da redução de mortalidade é interpretar erroneamente a realidade. Leonard
Sagan, em estudo das populações, afirma: "O
que explica de modo mais importante o declínio das taxas de mortalidade em todo
o mundo é o aumento da esperança e o declínio do desespero e da desesperança.
(Sagan, L. (1987). The health of
nations: True causes of sickness and well-being. New York:
Basic Books).
A
redução da mortalidade ter por causa a um fator tão sutil quanto a esperança
alerta para a epidemia silenciosa chamada Depressão. A característica marcante
da doença não é a tristeza, mas a perda da esperança. A incidência de Depressão
é insuficiente para causar impacto negativo sobre os índices de mortalidade,
mas é suficiente para os alarmantes dados que mostram que uma pessoa suicida-se
a cada 40 segundos em todo o mundo.
O
Hotel de Dieu é uma obra monumental, sua construção durou 5 séculos até que
chegasse à estrutura atual, e foi totalmente reformado no final do século XIX.
Já não tem o cheiro pestilencial e nem mais é depósito de indigentes e
moribundos. Como toda instituição médica ocidental, foi fortemente influenciado
pelas orientações de Ibn Sina, ou Avicena, que foi considerado por Osler como o
maior médico de todos os tempos.
Nossas
ruas de asfalto ainda escondem a sujeira que acumulamos em lotes vazios,
alimento de ratos e criadouros de larvas de vetores de doenças que nos afligem.
Nosso trânsito continua movido a gasolina, xingamentos e sangue, nos lembrando
fortemente que as conquistas da civilização demoram muito a surtirem efeito
entre os de nossa terra brasilis.
(*) presidente da Associação Médico-Espírita de Goiás - AME-GO.
Isso explica ainda que em pleno século XXI o Brasil ainda enfrenta epidemias como a dengue, e quadros de tuberculose e tantas outras "demias".
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