Por Jorge Hessen (*)
Confrades solicitaram-me comentar novamente
sobre a tendência umbandista nas instituições espíritas cristãs. Disseram-me
que muitos centros “espíritas”, localizados no planalto central, possuem
dirigentes, trabalhadores e frequentadores que ainda não se desataviaram dos
ritos umbandizantes. São frequentadores, médiuns e doutrinadores que não
conseguem se livrar das entidades de “terreiro”. Como se não bastasse, há os
que elegem na instituição espírita cristã “mentores ou mentoras” de espíritos
impregnados dos atavismos psicológicos de “vovós sicranas” ou “vovôs
beltranas”, ou veneram “ex” “preto(as) velhos(as)” etc., como se tais
“entidades” fossem campeãs da humildade. Nada mais inconsistente! E não se
podem comparar tais “entes” com os sensatos espíritos que se apresentaram como
“ex-padres” e “ex-freiras” na concepção da Codificação Espírita.
A rigor, os cognominados “vós fulanas”, “vôs
fulanos”, “pretos(as) velhos(as)”, “índios”, “caboclos” e semelhados, quando
desencarnados, não mais pertencem a quaisquer das distintas raças humanas
terrenas. No além-túmulo, o espírito não é amarelo, nem vermelho, nem negro,
nem branco, embora possa apresentar em seu perispírito distinções de alguma
raça, idade, se ainda assim se sentir em face da limitação moral e intelectual
e ou assim se conceber, como sucedeu numa das reuniões realizadas na Sociedade
Parisiense de Estudos Espíritas, em que Allan Kardec dialogou com um Espírito
de um “velhinho” (Pai César), episódio narrado na “Revista Espírita” de junho
de 1859.
A entidade disse a Kardec que havia
desencarnado em 8 de fevereiro de 1859, com 138 anos de idade. Tal fato [idade]
chamou a atenção do Codificador, que logo se interessou em obter, da
Espiritualidade, mais informações sobre o falecido. O “velhinho” disse que
havia nascido na África e tinha sido levado para Louisiana [EUA] quando tinha
apenas 15 anos. Desabafou, expondo a todos as mágoas guardadas em seu coração,
fruto dos sofrimentos por que passara na Terra em função do preconceito da
época. E tamanhas eram as feridas que trazia no peito que chegou a dizer a
Kardec que não gostaria de voltar à Terra novamente como negro.
Será que um “vovô”, uma “vovó”, um(a)
preto(a) velho(a), pode ser mentor(a) espiritual de uma casa espírita cristã?
Em que pese considerar estranhíssima essa situação, talvez sim! Quem sabe possa
uma dessas entidades, através de suas palavras e atos, mostrar que é digna
desse título, se demonstrar conhecimentos doutrinários superiores aos nossos a
fim de nos orientar e manifesto amor para nos exemplificar. Porém, não! se
evidenciar insuficiente cultura, pouca evolução espiritual e muito apego ainda
às sensações materiais (exigir os títulos de “vovô”, “vovó”, preto(a) velho(a),
linguajar primário, argumentos infantis, raciocínio vagaroso, etc.
A maioria absoluta das comunicações de
pretos-velhos como “mentores espirituais” de uma instituição genuinamente
espirita cristã é resultado da insipiente sugestão mediúnica, do incabível
animismo, ou dos ardis psicológicos e das teimosas mistificações. Pessoalmente
não aprovo nem compreendo a manifestação de um “Bezerra de Menezes” travestido
de velhinho caquético com voz de “defunto”. Creio que há animismo nesse
“transe” ou vício psicológico do “intermediário”.
Não desconhecemos que houve, seguramente,
espíritos bondosos que encarnaram entre os negros africanos para inspirar
aquele povo sofrido, de modo sábio e amoroso, durante o seu cativeiro. Alguns
deles, após a morte, certamente tenham podido regressar à retaguarda terrena,
por amor ao próprio crescimento espiritual no serviço do bem. Mas não foram
numerosos tais espíritos “bonzinhos”, “humildezinhos”; pela lógica, foram
raros, porque quase a totalidade dos escravos eram como nós: espíritos de
mediana ou pouquíssima evolução.
Há obsessores (e não são poucos) que fingem
essa aparência e linguajar (de entes de “terreiros”) com o objetivo de iludir e
manter sob hipnose os espíritas ignorantes. Diante desses perspicazes seres do
além (às vezes tão-somente produto da mente do “médium”), procuramos adverti-los,
alertá-los para a responsabilidade pelos seus atos. Se não acolherem nossas
advertências apelamos ao expediente da austeridade verbal e da segurança moral
para que se arredem do local, exorando, por nossa vez, o amparo dos diretores
espirituais da sessão.
Nas sessões mediúnicas que dirijo há 4
décadas, se ocasionalmente há manifestação de tais espíritos (“vós”, “vôs”,
“pretos(as) velhos(as)”, caboclos e correlatos), se for permitida pela
espiritualidade diretora da sessão, tais espíritos são orientados
adequadamente. Não permitimos qualquer intolerância ou preconceito contra eles.
Entretanto, analisamos atentamente sua natureza e o conteúdo de suas
comunicações, como fazemos com qualquer espírito que se manifeste no grupo.
Tais espíritos, para se comunicarem mediunicamente, não precisam e nem
estimulamos o uso de linguajar bizarro, incompreensível aos médiuns e aos
participantes da reunião.
O bom senso recomenda que se um desses
desencarnados insistir na aparência ou linguajar momentaneamente de suas
personagens do passado e deseja evidenciar sua identidade, a manifestação será
admissível, se houver quem o possa identificar. Caso contrário será uma
comunicação improdutiva. Se tais entidades se apresentam com atavismos da
última encarnação (ex-escravos “velhos ou novos”, índios etc.) buscamos
orientá-los, a fim de se libertarem desse atavismo. Assim, buscamos
esclarecê-los quanto à sua real natureza de espíritos em evolução. Na
doutrinação nos esforçamos para advertir-lhes que já reencarnaram diversas vezes
em diferentes condições e, portanto, têm patrimônio espiritual mais vasto que
um simples “velho” ou correlato de uma raça sofrida.
Deste modo, procuramos revelar-lhes que não
precisam se fixar no psiquismo da existência que concluíram, e que na vida
espiritual podem continuar progredindo em todos os aspectos, até mesmo no modo
de se vestir e falar. Há os que usam sutis subterfúgios, dizendo que se
apresentam assim porque tal ou qual encarnação lhes foi muito grata por lhes
haver permitido adquirir “virtudes”, especialmente a “humildade” e daí seu
desejo em exemplificar. Óbvio que esse argumento é astucioso, pois quem
conquistou a virtude da humildade não precisa trombetear e ou ostentar
trejeitos de falsas modéstias. Por essa razão orientamos tais “velhinhos” que a
humildade não consiste em expressões verbais e aparências exteriores nem em
atitudes subservientes.
Muitas pessoas supõem que pretos-velhos,
índios e caboclos sejam serviçais para lhes atenderem aos pedidos. Outras
acreditam que eles tenham poderes misteriosos, capazes de resolver de modo
mágico os problemas dos consulentes. Parecem também julgá-los subornáveis, já
que aceitariam agir em troca de algum “pagamento” ou compensação. Em verdade,
uma evocação por rituais específicos convidam e condicionam certos espíritos a
se apresentarem como preto-velhos, índios ou caboclos. E alguns espíritos, às
vezes até os bonzinhos, adotam essa aparência para que assim as pessoas do meio
em que se vão manifestar (“terreiro”) acolherão mais espontaneamente a sua
apresentação e recomendações.
Enfatizamos porém, que se não estimularmos
esse condicionamento, muitos espíritos deixarão de se apresentar como
vermelhos, pretos, brancos, velhos, novos etc. etc. etc., passando a se
comunicar em seu modo próprio e natural. Muitos entendem que os “vovôs”,
“vovós”, “caboclos” e “pretos-velhos” são mais eficazes. Creem que as proteções
que os Espíritos normais não obtêm os tais mágicos “velhinhos” e “índios”
conseguem. Nada mais bisonho!
Sobre o linguajar de tais entes, observamos
que a fala de “pretos velhos” não costuma corresponder aos legítimos dialetos
africanos ou aportuguesamento deles de épocas remotas. É mais uma tagarelice,
uma enrolação, uma confusão de vozes sem significado ou ligação com o que os
africanos falavam. A isso classifico de mistificação. Sobre os tais caboclos, é
óbvio que índios brasileiros não poderiam jamais se denominarem por exemplo
“caboclos 7 flechas” (não tinham noção de número), não se autodenominariam
“flecha ligeira”, “nuvem branca” etc., como o fazem os índios norte-americanos,
os quais as academias de hollywood popularizaram nos filme de “bang bang”.
Em suma, somos espíritas cristãos, e como
tais devemos nos comportar e agir no dia a dia, especialmente nas sessões
mediúnicas. Em boa lógica, quem não acolha ou não se encaixe nos conceitos e
práticas espíritas cristãs precisa procurar diferentes recintos afins, até
porque nenhuma pessoa é constrangida a ser espírita cristã.
SEMINÁRIO: Manifestação de fundo umbandista
no meio espirita
Parte 1
Parte 2
Parte 3
(*) escritor
com dois livros publicados, professor, jornalista e articulista com diversos
artigos publicados na Revista "O Médium" de Juiz de Fora,
"Reformador" da FEB, "O Espírita" de Brasília, Jornal da
Federação de Mato Grosso e Jornal da Federação do DF, Revista O Consolador,
Revista Espiritismo e Ciência, Jornal o Imortal, e é orientador do Portal
“Autores Espíritas Clássicos”
Bem produtivo este artigo, pois eu mesmo já recebi em sessão mediúnica ex-pai de santo e índio. Na verdade alguns desses espíritos ainda estão ligados à materialidade de suas encarnações e acham relevante sua atuação na vida terrena naquelas condições.
ResponderExcluirPor outro lado, tenho observado que o médium tomando as devidas precauções no sentido de que a incorporação seja o mais possível espontânea obterá sempre mensagens autênticas.
Que Deus esteja com todos!
ótimo artigo e enriquecedor aos que possam e tenham oportunidade de acessá-lo. Meus parabéns.
ResponderExcluirPessoalmente concordo com o que aborda o articulista. Apenas faço uma ressalva a uma citação que passa muito secundária em sua crítica e, na minha opinião, também se trata de um equívoco de linguagem quando falamos de Doutrina Espírita. Espiritismo Cristão é expressão inadequada e sim só Espiritismo, pois sem o Cristo tal denominação NÃO EXISTE. Roberto caldas
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