Entrevista
com Severino Celestino (*)
O
Evangelho Segundo o Espiritismo, de Kardec, aborda somente, alguns capítulos do
Novo Testamento. Assim, qual a posição do Espiritismo face ao Velho Testamento?
Resposta: A posição do Espiritismo tem que
ser a posição de Jesus que é fidelidade a Torá e os profetas. Veja Mateus 5:17:
“Não penseis que vim abolir a Torá e os profetas, Não vim abolir, mas dar-lhes
pleno cumprimento”. Portanto a Doutrina espírita tem que ser fiel ao (Antigo
Testamento) ou mais apropriadamente “Primeira Aliança”. Assim, não devemos
desprezar a “Primeira Aliança”, só porque não a conhecemos bem.
Gostaria
de saber porque Jesus disse estas palavras quando na cruz: "Pai, porque me
abandonastes", sabendo ele da sua missão na terra e sendo o espírito de grandeza
que é?
Resposta: Jesus não se sentiu abandonado. Ele
tinha plena convicção da sua missão. Ele apenas repete ou recita na cruz, o
Salmo 22, que é um salmo profético de Davi falando sobre o que aconteceria com
o Messias. Confira...
A
revista "Super Interessante"
de julho trouxe um artigo sobre a Bíblia, com estudos arqueológicos, provando
que grande parte do Antigo Testamento não tem embasamento histórico. Gostaria
de saber, se na sua opinião, Moisés realmente existiu, e o que acha das demais
colocações feitas no artigo.
Resposta: É um artigo interessante, mas que
precisa ainda ser melhor avaliado. Suas conclusões são muito fortes.
Necessitamos ainda de melhores esclarecimentos. Pessoalmente acredito na
existência de Moisés. Negar a sua existência é uma coisa e provar a sua
inexistência é outra. Considero um assunto ainda em aberto.
Qual
a missão dos profetas do Velho Testamento?
Resposta: A Missão de um médium de Deus. Os
profetas não eram senão, médiuns escolhidos por Deus para chamar atenção de
reis e dirigentes que não estavam preocupados com as questões espirituais. Deus
os enviava para alertá-los e pode observar que os reis que não os escutavam,
quase sempre caiam. A palavra NAVI em hebraico significa profeta e profeta é um
intermediário entre o mundo espiritual e o mundo material, ou seja, um MÉDIUM.
No entanto, existe uma diferença: os profetas prediziam acontecimentos futuros,
os médiuns hoje não possuem esta função e sim a função de trazer a mensagem
espiritual reformadora para os homens.
Podemos
confiar na Bíblia como documento, devido a diversas alterações com o decorrer
do tempo e de diversas alterações? Sabemos da pobreza de palavras, na época,
com diversos sentidos, com diferentes sentidos!
Resposta: A Bíblia sofreu muitas alterações
nas suas diversas traduções, como podemos demonstrar em nosso livro “Analisando
as Traduções Bíblicas”. No entanto, a Bíblia em seu texto original, o HEBRAICO,
é confiável, pois apesar das diversas adversidades enfrentadas pelo povo
hebreu, os seus sacerdotes e escribas souberam, em todas as regiões por onde o
povo hebreu passou, conservar seus textos íntegros. Os escribas ainda hoje
trabalham na conservação dos textos originais. Em todas as Sinagogas judaicas
do mundo inteiro existem textos originais da Bíblia e mais de um.
Quais
livros que são lendas, ou cheias de simbolismos, e os que são verdadeiros, não
lendários na Bíblia?
Resposta: Qualquer livro da Bíblia deve ser
avaliado antes de sua leitura sobre três aspectos: Quando foi escrito? Para
quem foi escrito? E Por que foi escrito? Partindo-se destas premissas você pode
sem dificuldade, filtrar o que é ensinamento, o que é história e o que é lenda.
Assim, por exemplo, o Gênesis até o capítulo 11 se constitui de proto-história.
A história de Adão e Eva, por exemplo, é uma Lenda.
Os livros de Emmanuel, na minha visão, trazem
muitas revelações sobre fatos reais da Bíblia. Como no livro "Há dois mil
anos", em que traz o retrato de Jesus e que foi encontrado com o Duque de
Cesadine em Roma, também foi encontrado a estátua de Lívia e em "Paulo e
Estêvão" ele nos diz que os Evangelhos foram escritos um ano após a morte
de Jesus. Eu queria saber o que é real, provado, dessas revelações.
Resposta: Cientificamente não se tem ainda,
condições de provar nada neste sentido. A história de Jesus passou despercebida
pelas autoridades de então. Muito poucas são as citações a seu respeito. E tudo
isto torna difícil de se provar a sua real mensagem entre nós. Leia o nosso
novo livro “O Sermão do Monte”, onde
você vai receber maiores esclarecimentos neste sentido.
Quando
nós nos propomos a formular a ideia da reencarnação, vem sempre a mente as
passagens de Nicodemos, e a de Elias, ora pra nós está claro pelo fato de sermos
estudantes da doutrina, porém ao vulgo devemos nosso respeito e precisamos
conceituar de maneira mais clara. Como você esclareceria isto?
Resposta: A Bíblia possui do Gênesis ao
Apocalipse passagens sobre a Reencarnação e isto no texto original HEBRAICO.
Todo judeu ortodoxo é reencarnacionista e o é, com base na Torá que é um livro
respeitado e seguido pelos judeus. A Cabalá, ciência judaica, fala claramente
da Reencarnação e ainda esclarece que a Bíblia possui 613 mandamentos e que o
judeu só pode ir à
Deus quando tiver cumprido todos os 613
mandamentos. E acrescenta que isto não pode ser cumprido em uma só existência.
Por isso, o judeu volta várias vezes em um processo que em hebraico se chama “
Guilgul Neshamot” que significa “ Transmigração
das almas. É semelhante a nossa conhecida reencarnação. A diferença é que para
eles, o espírito muito ruim pode retroceder e voltar como animal.
A
Bíblia nos fala da comunicação mediúnica como necromancia, e os detratores do Espiritismo
negam a comunicabilidade. Como fazer esta ideia transparecer?
Resposta: Leia o nosso livro “Analisando as
Traduções Bíblicas”, onde existe uma pesquisa de 10 anos nos textos hebraicos
originais. Nele mostramos cientificamente que nada disto procede. É apenas
interesse das religiões escravizadoras que querem manter os seus seguidores
presos aos seus princípios infundados. A Bíblia jamais poderia condenar o
Espiritismo que nem existia quando ela foi escrita. As recomendações do famoso
Deuteronômio 18:9-11 foram feitas para os hebreus que se encontravam na
planície do deserto do Sinai. Nós espíritas 4.000 anos depois não temos nada a
ver com isto.
O
que será de o "O Evangelho Segundo o Espiritismo", depois que o
Celestino traduzir a Bíblia? Ele está mudando tudo!
Resposta: Uma verdade não pode destruir
outra. O Evangelho Segundo o Espiritismo é uma obra fantástica que Kardec e os
Espíritos realizaram em tempo certo. A tradução da Bíblia não destruirá
absolutamente nada. Kardec utilizou as traduções existentes e fez questão de
citá-las inclusive as fontes que ele utilizou. Veja por exemplo: Ev. Seg.
Espiritismo capítulo I item 2- nota de rodapé; Cap. IV item 8-nota de rodapé.
Cap. XVI- item 2-nota de rodapé. Cap.XIX–item 7-nota de rodapé. Cap. XIII item
7-nota de rodapé. Observe que Kardec não aceitava as traduções que ele
utilizava, como última palavra e até explica em nossa última citação (Cap.
XXIII-item 7) como se equivocam os que traduzem a Bíblia. Portanto não estamos
destruindo Kardec, mas ratificando e esclarecendo a sua obra.
Parece
que o Celestino disse que os judeus são reencarnacionistas; como se explica que
alguém que crê na reencarnação planeje "acabar" com seus inimigos à força?
Resposta: Outro equívoco! Estamos misturando
religião com questões políticas. Uma coisa é a sobrevivência social e a outra é
a religião. A história dos hebreus foi sempre pautada em uma questão de
sobrevivência. Moisés era um legislador que cuidava do social e Aarão, um
sacerdote que cuidava do espiritual. Não há planejamento por parte dos judeus
para acabar com seus inimigos. A questão é bem mais profunda do que se
imagina. Busque na história e mesmo
bíblica, a origem de tudo. O povo hebreu descende de Abraão através de Isaac e
o povo árabe também descende de Abraão através do seu filho Ismael. Portanto
ambos possuem a mesma origem familiar. Portanto, esta é uma briga de família e
quem vai resolver é a própria REENCARNAÇÃO.
Por
que a Bíblia deixou de ser escrita, ou seja, por que o Apocalipse é considerado
o final da Bíblia, sendo que as revelações não cessaram?
Resposta: Isto é muito relativo e depende do
ângulo que é analisado. A Bíblia do judeu é constituída apenas do Velho
Testamento. Eles se satisfazem com ela e ainda afirmam que todas as verdades
estão em sua Bíblia, ou seja, na Torá. Os católicos afirmam que sua Bíblia é
composta de Velho e Novo Testamento e possui 73 livros, começando no Gênesis e
terminando no Apocalipse. Os protestantes afirmam que sua Bíblia é composta de
Velho e Novo Testamento e possui 66 livros. Nós espíritas aceitamos a Bíblia
completa e já sentimos a necessidade adicionar a ela o Pentateuco de Kardec.
Assim, cada época, tem sua peculiaridade de acordo com o padrão evolutivo da
época. No entanto, convém ressaltar que nós não acreditamos em previsões
futuristas, pois o nosso futuro é construído por nós mesmos no presente. É o
nosso “livre arbítrio”, uso e abuso, que rege tudo.
Quero
saber um pouco mais sobre a questão do batismo; por que o espírita não batiza
seus filhos?
Resposta: Jesus nunca batizou ninguém. Veja
João 4: 1 e 2. Seus discípulos batizavam, porém Jesus nunca batizou. Batismo
significa, filiação, aceitação. Aceitação implica em mudança e não é um
“ritual” que faz a pessoa mudar. Era Jesus quem sempre recomendava “Vai e não
peques mais”. Se conseguirmos nossa mudança interior, já estamos “batizado”. O
espírita não precisa batizar seu filho, mas ensiná-lo o verdadeiro caminho que
ele tem que seguir.
Gostaria
de saber o que seriam os espinhos na carne que Paulo de Tarso cita em uma de
suas cartas.
Resposta: A maioria dos exegetas afirmam que
seria alguma debilidade física ou enfermidade, e não a alguma prova moral ou
espiritual do apóstolo. Veja Gálatas 4:13 e 14. Pessoalmente acho que Paulo,
além de problemas físicos possuía também provações (obssessões) espirituais e
que a isto ele chamava de espinhos. O seu trabalho de fundação do cristianismo
não foi tarefa simples e ele teve que vencer todas as forças contrárias vindas de
espíritos inferiores.
Tive
a oportunidade de conhecê-lo na CONCAFRAS de Brasília, em 2000, quando do lançamento
do seu livro sobre as traduções da Bíblia. Depois ainda em uma palestra sua em
Londrina-PR. Gostaria de fazer duas perguntas: 1) Qual, na sua opinião, é a maior deturpação
dos ensinos de Jesus, registrada na Bíblia, em virtude de traduções erradas (ou
até de má fé...)? A segunda é sobre um comentário que ouvi de um pastor
protestante sobre a passagem em que o Cristo pergunta a Pedro por 3 vezes
consecutivas "Tu me amas, Pedro?" e Pedro lhe responde
afirmativamente em todas as vezes. Segundo o Pastor, as palavras usadas por
Pedro e Jesus para dizer amor têm sentidos diferentes e, enquanto Jesus usa no
sentido de compromisso, o sentido dado por Pedro é de simpatia. Nos seus
estudos você chegou a observar essa diferença na palavra original usada por
cada um para designar o amor?
Resposta: Existem muitas. Vamos por parte:
Jesus não falava grego nem pronunciou seus ensinamentos em grego. Jesus falava
hebraico e em algumas situações falava aramaico. Tudo que ele falou foi escrito
em grego e 50 anos depois. Assim, os seus ensinamentos vieram de acordo com a
visão de quem contou a sua história. Jesus nunca escreveu nada e por isso fica
difícil afirmarmos categoricamente algo sobre ele. Imagine que aqueles que não
têm escrúpulo e querem dirigir as coisas em seu benefício não se preocupam com
a fidelidade dos seus ensinamentos. O resultado o que temos hoje: interpolações
de todos os sentidos em seus evangelhos.
Com relação a segunda, Isto não ocorre no
hebraico, que foi a língua usada por Jesus. Em hebraico O AMOR só tem uma
concepção. Estas divergências de conceito só existem no texto grego. Você tem
aí um exemplo das divergências e diferenças com relação ao que Jesus disse e o
que passam para nós.
Qual
a melhor forma de fazermos uma leitura da Bíblia nos tempos de hoje? E sua prática
diante de tantas adversidades?
Resposta: É aconselhável primeiro um curso
básico sobre a Bíblia para poder tirar maior proveito. A Bíblia não deve ser
lida numa sequência livro-a-livro. Cada livro tem uma história que devemos
buscar. É sempre bom antes de se ler cada livro conhecer-se em que época ele
foi escrito, para quem foi escrito e por que foi escrito? Assim, você se situa
melhor e entende a sua mensagem.
O que
o senhor acha do livro "Os Quatro Evangelhos", de Roustaing, que traz
uma visão espírita dos evangelhos e também dos 10 Mandamentos?
Resposta: A obra de Roustaing possui
limitações e não aconselho o seu estudo como um roteiro de estudos. É uma obra
para se ler e tirar conclusões não definitivas. Sabemos que é uma obra recebida
por um só médium e que Kardec nos adverte sobre isso. A obra de Kardec foi
recebida em diversos locais e por diversos médiuns diferentes. Tire suas
conclusões...
A
Bíblia explica a origem do homem no sentido de humanidade. À luz da doutrina espírita,
qual é a necessidade de ter sido criado o homem?
Resposta: A criação do homem foi uma consequência
da evolução do universo. Segundo Kardec o mundo espírita é o mundo normal,
primitivo, eterno preexistente e sobrevivente a tudo. O mundo corporal não é
senão secundário; poderia cessar de existir, ou não ter jamais existido, sem
alterar a essência do mundo espírita. Entre as diferentes espécies de seres
corpóreos, Deus escolheu a espécie humana para a encarnação dos Espíritos que
atingiram um certo grau de desenvolvimento, o que lhe dá a superioridade moral
e intelectual sobre os outros.
¹ Fonte: CVDEE - Centro
Virtual de Divulgação e Estudo do Espiritismo/ http://www.cvdee.org.br
(*) pesquisador do hebraico e das religiões,
principalmente o judaísmo, base de todas as religiões cristãs. Sempre estudou a
essência e conteúdo divinos da Bíblia em sua língua original, o hebraico.
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