Em pequena localidade francesa, duas irmãs
andavam às voltas com estranhos acontecimentos: suas roupas eram espalhadas por
todos os cantos da casa e até pelos telhados. Apresentavam-se cortadas,
rasgadas e crivadas de buracos, mesmo quando trancadas à chave.
“Brincadeira
de mau gosto!” — concluíram.
Todavia, a irritante persistência daquelas
depredações, apesar das precauções que tomavam, convenceu-as de que não
poderiam ser provocadas por mãos humanas...
Durante anos sofreram prejuízos e
contrariedades, até que ouviram falar de Allan Kardec, o homem que se tornara
intérprete dos Espíritos.
Inteirando-se do caso, o Codificador não teve
dúvidas: tratava-se, evidentemente, das diabruras de um Espírito zombeteiro,
que, evocado, mostrou-se inteiramente refratário a conselhos e esclarecimentos.
Somente a oração pôde exercer sobre ele alguma influência, afastando-o de suas
vítimas que, durante algum tempo, desfrutaram de tranquilidade. Mas logo
recomeçaram as depredações, e Kardec, desejando livrá-las daquele tormento, solicitou,
em ocasião oportuna, a orientação de um Espírito superior, o qual esclareceu:
“O
que essas senhoras têm de melhor a fazer é rogar aos bons Espíritos seus
protetores que não as abandonem. Nenhum conselho melhor lhes posso dar que o de
dizer-lhes que desçam ao fundo de suas consciências, para praticar o amor ao
próximo e a caridade. Não falo da caridade que consiste em dar e distribuir,
mas da caridade da língua; pois, infelizmente, elas não sabem conter as suas e
não demonstram, por atos de piedade, o desejo que têm de se livrar daquele que
as atormenta. Gostam muito de maldizer do próximo e o Espírito que as obsidia
toma sua desforra, porquanto, em vida, foi para elas um burro de carga.
Pesquisem na memória e logo descobrirão quem ele é.
“Entretanto,
se conseguirem melhorar-se, seus anjos guardiães se aproximarão e a simples
presença deles bastará para afastar o mau Espírito, que se agarrou a uma delas,
em particular, porque o seu anjo guardião teve que se afastar, por efeito de
atos repreensíveis ou maus pensamentos. O que precisam é fazer preces
fervorosas pelos que sofrem e, principalmente, praticar as virtudes impostas
por Deus a cada um, de acordo com a sua condição.”
Kardec achou um tanto severas aquelas
advertências e ponderou que talvez fosse conveniente transmiti-las de forma
atenuada, mas o Orientador, conhecendo melhor as necessidades das duas irmãs,
confirmou:
“Devo
dizer o que digo e como digo, porque as pessoas de quem se trata têm o hábito
de supor que nenhum mal fazem com a língua, quando o fazem muitíssimo. Por
isso, preciso é ferir-lhes o Espírito, de maneira que lhes sirva de advertência
séria.”
Registrando esse episódio em O Livro dos
Médiuns, cap. XXIII, item 252, conclui Kardec:
“Ressalta
do que fica dito um ensinamento de grande alcance: que as imperfeições morais
dão azo à ação dos Espíritos obsessores e que o mais seguro meio de a pessoa se
livrar deles é atrair os bons pela prática do Bem. Sem dúvida, os bons
Espíritos têm mais poder que os maus, e a vontade deles basta para afastar
estes últimos; eles, porém, só assistem os que os secundam pelos esforços que
fazem por melhorar-se, sem o que se afastam e deixam o campo livre aos maus,
que se tornam, assim, em certos casos, instrumentos de punição, visto que os
bons permitem que ajam para esse fim.”
E concluiríamos nós: quantas perturbações e
desequilíbrios seriam evitados se, em todas as situações, procurássemos, antes
de tudo, conter a língua!
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