Deus é meu pastor, não me faltará
O Salmo 23 é um dos mais belos da Bíblia.
Nele está toda confiança que se pode depositar em Deus.
Este Salmo faz parte da oração na sinagoga
judaica e é recitado (cantado) no fim do Ofício de Cabalat Shabat, que
significa recebimento do sábado.
Quando realizam esta oração, os judeus
utilizam com relação a Deus o título de Adonai que significa meu Senhor.
A história deste Salmo representa confiança e
esperança em Deus. Quando David o compôs, ele vivia um dos mais perigosos e
desencorajadores períodos de sua vida. Era um fugitivo derrotado, fugindo do
rei Saul e seu exército.
Naquele momento, ele se embrenha
no deserto da Judeia e diante de toda a esterilidade e solidão do deserto,
compõe este belíssimo hino de confiança em Deus. David sente que diante daquela
imensidão de deserto que parece nada existir, está Deus que sempre está conosco
em qualquer dificuldade de nossa vida. Ele não nos abandona nunca.
David não limita sua
inspiração a si próprio; mas a utiliza para cantar para todo o povo de Israel,
recordando como Deus proveu toda nação através dos quarenta anos vividos no
deserto.
Este Salmo é recitado após
lavar as mãos e antes das bênçãos, ao término das refeições.
A guematria (ciência dos
números), explica a ligação entre o Salmo 23 e a refeição. O Salmo contém 57
palavras, que é o mesmo valor numérico da palavra Zan, alimento. A
interpretação, segundo a guematria acrescenta, ainda, que o Salmo contém 227
letras, o equivalente numérico da palavra (Brachá), bênção. Os que recitam este
Salmo e vivem de sua mensagem serão sempre abençoados com muitas bênçãos.
Conta a tradição Judaica que
David escreveu a maioria dos seus Salmos, inspirado pelo Santo Espírito (Rúach
Ha-Kodesh), quando a harpa pendurada sobre sua cama tocava, à meia-noite, ao
sopro de um vento do norte. David despertava e começava a compor. Ainda segundo
a tradição, as cordas dessa harpa eram feitas do intestino do cordeiro
oferecido em sacrifício a Deus por Abraão, em lugar de seu filho Isaac, no
monte Moriá.
A tradução deste Salmo, através dos séculos
tem escondido ou deturpado o seu verdadeiro significado. Trazemos para você a
riqueza da linguagem deste Salmo, quando o traduzimos em sua essência original
hebraica.
Tenho muito respeito pelos tradutores da
Bíblia de Jerusalém, mas neste salmo eles deixaram muito a desejar.
Vejamos a tradução do Salmo 23, segundo a
Bíblia de Jerusalém.
“O Senhor é meu pastor, nada me faltará.
Deitar-me faz em verdes pastos, guia-me mansamente a águas tranquilas.
Refrigera minha alma; guia-me por veredas de justiça, por amor do seu nome.
Ainda que eu ande pelo vale da sombra da morte, não temerei mal algum, porque
Tu estás comigo. A tua vara e teu cajado me consolam. Preparas uma mesa,
perante mim na presença dos meus inimigos. Unges a minha cabeça com óleo; meu
cálice transborda. Certamente que a bondade e a misericórdia me seguirão, todos
os dias da minha vida. E habitarei na casa do Senhor por longos dias”.
(Tradução da Bíblia de Jerusalém- Edições Paulinas, 4a. reimpressão, 1989).
Apresentaremos agora a verdadeira tradução,
com comentários, para que você possa comparar.
“Deus é meu pastor não me faltará”. Todos os
tradutores levam esta primeira frase do Salmo para um sentido que muda
completamente o que realmente David quis dizer. David, na verdade está dizendo:
“Deus é meu pastor, não me faltará”. Todos teimam em traduzir “nada me
faltará”, como se Deus fosse apenas um provedor das coisas materiais que
precisamos, no entanto, aqui significa que é o próprio Deus quem não nos
faltará. É o próprio Deus que nos assiste na dificuldade. É o próprio Deus a
nos prover de tudo que necessitamos principalmente as necessidades espirituais.
É necessário ressaltar ainda que todos os
verbos desse salmo estão no futuro, embora a maioria dos tradutores os coloquem
no presente.
Naquela época, os hebreus eram um povo, que
tinha como principal atividade cuidar de rebanhos e essa imagem do pastor é
colhida no âmago de sua vida cotidiana. Da vigilância do pastor dependem a
saúde dos rebanhos e a prosperidade da tribo.
O pastor é o símbolo da proteção, é ele quem
conduz as ovelhas para o abrigo por ocasião do tempo inclemente e é quem as
defende contra animais e bandidos. O título de pastor era dado aos reis e
deuses. David era pastor e matou leões e ursos para defender seu rebanho. (I Sm
17: 34-37). Jacó foi pastor (Gn. 31: 38-41). O Cristo se intitulou o Bom
Pastor.
“Em verdes pastagens me fará descansar”.
Aqui, David reforça a proteção de Deus como o verdadeiro pastor de Israel (Gn.
49:24), que conduz José como um rebanho (Sl. 80:2), carrega as suas ovelhas (Sl.
28:9), guia-as (Sl. 77:21; 78:52), reúne o resto (Jr. 23:3), guarda Israel (Jr.
31:10), como pastor retorna Israel às suas pastagens (Jr.23:3; 50:19). Deus
reúne os perdidos, conduze-os à sua própria pastagem, pensa as feridas,
guarda-os na ordem e na paz (Ez.34:11-22).
Observe que depois do primeiro versículo do
Salmo, todos os verbos estão no futuro, o que demonstra a confiança de David na
proteção divina que virá. Assim, você tem: me fará descansar... me conduzirá...
fará meu espírito voltar... Ele me guiará... Etc. Etc. Etc.
“Para a tranquilidade ou descanso das águas
me conduzirá, fará meu espírito voltar; Ele me guiará por trilhas justas por
causa do seu nome”.
Ele me fará voltar a mim mesmo, restaurará
meu ser, fará meu espírito retornar, uma condição de meu retorno a Ele pela
evolução ou de voltar a vida física pela reencarnação para a evolução.
Podemos analisar o versículo dentro da ótica
reencarnacionista, afirmando que Deus nos conduzirá para a tranquilidade das
águas uterinas, ou seja, para o líquido amniótico (líquido onde fica imerso o
feto durante a gestação – este líquido protege o embrião contra choques,
promovendo, assim, a sua tranquilidade e proteção). É este o ambiente tranquilo
por onde o espírito volta ou retorna ao corpo físico.
O primeiro versículo do Gênesis (1:1) fala
que no princípio criou Deus os Céus e a terra. A palavra “céus” em hebraico,
“Shamaim”, significa: “Carrega água”, “Ali existe água”; “fogo e água” que,
misturados um ao outro formaram os Céus. Como podemos observar, tudo começou
com as águas. Água é vida e essa era a crença geral naquela época.
Lembre-se das palavras do Cristo em João 3:3:
“Aquele que não renascer pela água e pelo espírito não entrará no reino dos
Céus”. Aqui, David mostra que Deus faz nosso espírito voltar por águas
tranquilas e ainda nos guia por caminhos ou trilhas justas durante a nossa
caminhada no corpo físico. Existe uma justiça divina (tsédek) neste retorno em
trilhas ou caminhos reencarnatórios.
Os gregos afirmavam que as almas giravam durante
mil anos no Hades, e, quando tinham de voltar, bebiam das águas do Letes, rio
existente no Hades que lhes tirava as lembranças das existências passadas.
Para Tales (625-548 a.C.), o princípio de
todas as coisas era a água. Ele concebia uma totalidade e um princípio para
essa totalidade. A água era o começo das coisas enquanto princípio que as
governava.
“Ainda que eu caminhe pelo vale da morte, não
temerei nenhum mal, pois Tu estarás comigo”. Aquele que entende o princípio da
reencarnação não teme a morte, pois sabe que ela não destrói o espírito, mas
apenas o corpo físico e este será devolvido novamente por Deus em sua infinita
misericórdia. David fala que não teme a morte, pois sabe que Deus não vai
deixá-lo só e por isso se mostra tão confiante em uma vitória e um novo retorno
à vida física.
Teu bastão e teu cajado me confortarão. Temos
aqui mais dois símbolos: um de punição e outro de proteção.
O filho errado aceita com humildade a punição
do seu pai, que é o educador supremo.
O bastão de madeira é o símbolo da proteção.
Era o utensílio indispensável para o israelita, sendo usado pelos viajantes
(Ex. 12:11) e pelos guerreiros (I Sm. 14:27). Servia para guiar os burros (Nm.
22:27). É um instrumento para a colheita (Is. 28:27) e, em caso de emergência,
servia para cavar uma fonte ou um poço (Nm. 21:18). É ainda o instrumento
através do qual Deus opera maravilhas. (Ex. 4:2ss 7; 7: 15ss; 8:1; 9:23; 10:13;
Nm. 20:8s; 2Rs 4: 29ss).
Diante de mim prepararás uma mesa, na
presença dos meus provocadores. Aqui muitos colocam a palavra inimigo em suas
traduções. Na verdade, concordamos que o melhor significado para a palavra
hebraica usada (tsarar) é o significado de provocadores, hostilizadores,
perseguidores, que são aqueles que nos instigam à pratica do mal. A confiança
em Deus e a mesa preparada por Ele que é a conduta reta a seguir fazem com que
os vençamos. As refeições judaicas possuem um ritual preciso e a quarta
refeição ou Ceia que se realizava pela hora nona (três ou quatro horas da
tarde) era a refeição principal e também oficial. Nessa ceia eram servidos
muitos pratos, e frequentemente tinha longa duração, até o crepúsculo,
especialmente quando se tratava de uma ocasião festiva, aqui citada por David.
O banquete messiânico é uma representação da alegria do reino messiânico.
Em Isaías 25:6-8, encontramos um banquete
preparado por Deus sobre o monte Sião para aqueles que foram redimidos. Jesus
usa a imagem para descrever a bem-aventurança dos céus (Mt. 8:11), implica
também na parábola do filho pródigo (Lc.15:15-24). A última ceia é apresentada
como banquete messiânico antecipado: o cálice que ele compartilha com os
discípulos é um símbolo e uma promessa dos cálices que compartilhará com eles
em seu último banquete no reino do Pai.
Certamente, bondade e benevolência me
seguirão, todos os dias das minhas vidas. Observe o significado
reencarnacionista do versículo, onde David mais uma vez demonstra a sua confiança
no futuro, ou seja, em futuras vidas. Todos os dias das minhas vidas, significa
no presente e em futuras encarnações. A palavra chaim-vidas- colocada no texto,
demonstra este significado, ausente em todas as traduções em português.
“E voltarei na casa de Deus por longos anos.”
Aqui temos, mais uma vez, o verbo shuv (retorno), colocado no futuro ou
incompleto (iashavti) significando voltarei, podendo significar também
habitarei. Mas temos, aqui, mais um significado reencarnacionista do Salmo que
se completa neste final. David afirma que voltará à casa de Deus, que significa
o Templo, que é a sede e o símbolo de Iahvéh no meio do seu povo. É o lugar
onde Isaías instituiu a santidade de Iahvéh e a própria missão profética (Is.
6:1-9). A expressão hebraica (loréch iamim) significa “para a longevidade”,
mas, aqui, quer dizer: por muitos anos. Observe que a expressão usada aqui, não
é “para sempre”, que seria uma expressão referente àquele que voltasse para o
mundo espiritual (‘Olam habá). A volta ao Templo por muitos anos, (por uma
vida, ou muitas vidas), esclarece que é a esperança de quem reencarna e
continua o seu elo com Deus, nas obras e na oração, que é o próprio Salmo
(Tehilim=Louvores).
Lamentamos que um Salmo tão belo e com uma
mensagem reencarnacionista tão forte tenha sido tão mal traduzido através
destes milênios.
Permaneçamos na paz de Jesus sempre!
Excelente texto do Confrade Severino Celestino, esclarecendo que a tradução correta do Salmo 23 é: "O SENHOR É MEU PASTOR E NÃO ME FALTARÁ." Infelizmente as pessoas em geral não raciocinam que a tradução do "NÃO" substituída pelo "NADA" torna a promessa irreal! Parabéns!
ResponderExcluirExcelente artigo e muito esclarecedor. Na questão que envolve a "mesa do banquete", não podemos nos esquecer também como costume já citado pelo Celestino, da serena e necessária colocação de Jesus na oração dominical. "O pão nosso de cada dia dai-nos hoje". Esse termo, já amplamente esclarecido por Kardec, nos inspira à oportunidade das circunstâncias da vida como um banquete diário para fazer o bem. O alimento físico-espiritual, necessário, que vêem pelas mãos dos espíritos que nos auxiliam (inclusive os que nos tentam ao mal) a sermos sempre melhores. Sinto apenas não ver as referências dos textos. De qualquer modo sou muito grato ao irmão Celestino por tal esclarecimento.
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