Nos deteremos na segunda parte deste artigo,
em torno do famoso diálogo entre Jesus e Nicodemos, narrado no capítulo 3:1-12
do Evangelho de João.
Este diálogo tem sido fruto de diversas
interpretações e quase sempre, estas não levam em consideração que é o encontro
entre dois judeus.
Nicodemos, judeu e dirigente principal dos
fariseus ou nassi, como se chama em hebraico. Jesus, judeu, com comportamento
marcante que o caracterizava como um homem diferente, amoroso e fiel na sua
tarefa de misericórdia e ajuda aos doentes e sofredores. Isto O diferenciava da
maioria que mais se preocupava com a ortodoxia do que com a prática do AMOR.
Nicodemos foi procurar Jesus à noite, como se
não quisesse se comprometer perante os seus, frente às consequências que aquele
encontro com Jesus, poderia trazer. No entanto, com base na história dos
evangelhos, os fariseus estavam sempre por perto em todas as ocasiões em que
Jesus realizava as suas tarefas de fraternidade, solidariedade e ajuda aos que
sofriam. Assim é que eles conheciam tudo que Jesus realizava e por isso
respeitavam os seus feitos incontestáveis. Observemos que Nicodemos saúda Jesus
como se tivessem, ele e os seus seguidores, plena consciência da importância de
Jesus e suas realizações. Por isso ele inicia a sua saudação, segundo João,
falando da seguinte forma: “Rabi, sabemos que vens da parte de Deus como um
mestre, pois ninguém pode fazer os sinais que fazes, se Deus não estiver com
ele. Jesus lhe respondeu: Em verdade, em verdade te digo: quem não nascer de novo
não pode ver o reino de Deus. Disse-lhe Nicodemos: Como pode um homem nascer,
sendo já velho? Poderá entrar uma segunda vez no seio de sua mãe e nascer?
Respondeu-lhe Jesus: Em verdade, em verdade, te digo: quem não nascer da água e
do Espírito não pode entrar no Reino de Deus. O que nasceu da carne é carne, o
que nasceu do Espírito, é espírito. Não te admires de eu te haver dito:
necessário vos é nascer de novo. O vento sopra onde quer e ouves o seu ruído,
mas não sabes de onde vem nem para onde vai. Assim acontece com todo aquele que
nasceu do Espírito.
Perguntou-lhe Nicodemos: Como isso pode
acontecer? Respondeu-lhe Jesus: És mestre em Israel e ignoras essas coisas? Em
verdade, em verdade, te digo: falamos do que sabemos e damos testemunho do que
vimos, porém não aceitais o nosso testemunho. Se não credes quando vos falo das
coisas da terra, como ireis crer quando vos falar das coisas do céu?” – João
3:1-12.
A primeira saudação de Nicodemos já demonstra
o seu grande reconhecimento sobre os conhecidos feitos ou milagres de Jesus.
Senão vejamos: “Rabi, sabemos que vens da parte de Deus como um mestre, pois
ninguém pode fazer os sinais que fazes, se Deus não estiver com ele”. O
“sabemos” aqui no início da saudação já demonstra que não era só Nicodemos, mas
todos os seguidores do seu grupo (fariseus), que conheciam Jesus, mas todos os
judeus. Eles estavam sempre acompanhando Jesus e analisando as suas
realizações.
Jesus aproveita a ocasião para falar de algo
conhecido e aceito pelos judeus e principalmente pelo grupo de seguidores de
Nicodemos, os fariseus: o “guilgul neshamot”, “vidas sucessivas”, ou “rodas da
alma” que depois da codificação, Kardec chamou de reencarnação. E afirma Jesus:
“Em verdade, em verdade te digo: quem não nascer de novo não pode ver o reino
de Deus”.
Este é um versículo que tem dado muito
trabalho aos exegetas que querem negar a Reencarnação. No entanto, é o mais
claro e contundente de todos, por isso, existe um verdadeiro malabarismo por
parte destes, no sentido de obscurecer o verdadeiro e claro sentido desta
passagem. Iniciamos pelo vocábulo “anóten” que em grego pode significar “de
novo” e “do alto”. A maioria coloca significando “do alto”, no entanto, nesta
passagem, esse vocábulo significa realmente “de novo”. Este malabarismo envolve
também a questão gramatical na tradução do texto. Lembramos que o diálogo tendo
ocorrido entre dois judeus, foi realizado no idioma hebraico. Assim, não
existiu a palavra grega anóten, mas a palavra hebraica nolad mmikor ‘al, que
significa nascer de novo, voltar à origem, voltar à fonte.
Observemos, no entanto, que a pergunta feita
por Nicodemos a Jesus, denota que ele entendeu que Jesus falava realmente em
nascer “de novo” e não “do alto”. Veja como ele se expressa: Como pode “o
homem, depois de velho, entrar pela segunda vez (deuteron-grego) ou (lashuv
lerechem-hebraico) voltar ao ventre materno?”
Esta ambiguidade de entendimento só acontece
na língua grega, porque no hebraico, que foi realmente a língua em que Jesus
dialogou com Nicodemos, este problema não existe. O texto é bem claro e jamais
pode significar “do alto”. Diz o seguinte: (“im lô ivaled ish mimkôr ‘al
lô-iukal lirôt et-malkut haelohim”) im=se, lô=nâo, iualed= incompleto do grau
qal do verbo “nolad” = nascer, ish= um homem, mimekôr= palavra composta,
formada por mi=de +makôr=fonte de água viva, origem. Existe a expressão
hebraica “Mekôr chaim” que quer dizer “fonte da vida”. Observe que não existe
nada referente “ao alto”, como muitos querem fazer entender, baseados no texto
grego. Assim, o Cristo fala que aquele que não nascer em origem, no sentido de
se voltar à fonte original da vida, ao útero materno em outra existência, ou
seja, nascer novamente, “não poderá” (lô-iuchal =incompleto do verbo iachôl
=poder) ver o reino de Deus (lirôt et-malkut haelohim).
Assim, no diálogo, a palavra grega “anóten”
tem o sentido e significado de “de novo”, portanto, Jesus falava de retorno, ou
seja, de Reencarnação mesmo, como pode ser visto no texto hebraico.
Lembramos, ainda, que Nicodemos já era um
cidadão de idade avançada e o Cristo lhe fala de Reencarnação (Nascer de Novo),
como uma esperança e reconforto para ele, mostrando-lhe que a vida não termina
com a morte, nem os velhos devem temer a morte, pois podem renascer e começar
tudo novamente.
Na sequência, Cristo confirma que era isso
mesmo que Ele queria dizer: “Quem não nascer de água (materialmente, com o
corpo denso, dado que o nascimento físico é feito através da bolsa d’água do
líquido amniótico), e do espírito (pneumatos-grego), (ruách-hebraico), ou seja,
que adquira nova personalidade no mundo terreno, em cada nova existência, a fim
de progredir). Se Nicodemos entendeu ao pé da letra as palavras de Jesus, o
Mestre as confirma ao pé da letra e reforça o seu ensino. Com efeito, o
espírito, ao reentrar na vida física, pode ser considerado o mesmo espírito que
reinicia suas experiências, esquecido de todo passado”.
A questão gramatical: No texto em grego não
há artigo diante das palavras “água” (ek ydatos= de água) “e espírito” (kai
pneumatos), portanto, o texto fala em nascer “de água e de espírito”. Não é,
portanto, nascer da água do batismo, nem do espírito, mas de água (por meio da
água) e de espírito (pela Reencarnação do espírito).
O primeiro versículo do Gênesis (1:1) fala
que no princípio criou Deus os Céus e a terra. A palavra “céus” em hebraico
“Shamaim” - significa: “que carrega água”, “Ali existe água”; “fogo e água”
que, misturados um ao outro, formaram os Céus.
Como podemos observar, tudo começou com as
águas. Água é vida e essa era a crença geral naquela época. É lógico que o Cristo
não falava de batismo e sim de retorno através da água. Lembramos ainda que 99%
da constituição das células reprodutoras são água.
Daí a explicação que segue: “o que nasce da
carne (ek tês sarkos) com artigo (tês) em grego, é carne”, isto é com corpo
físico, com toda a hereditariedade física herdada do corpo dos pais; “e o que
nasce do espírito (ek tou pneumatos) é espírito”, ou seja, o espírito que
reencarna provém do espírito da última encarnação com toda a hereditariedade
pessoal (cármica ou de débitos) que traz do passado.
E Jesus prossegue: “Por isso não te admires
de eu te dizer: é-vos necessário nascer de novo”. Observe a diferença de
tratamento: “dizer-TE” no singular, e “é-VOS” no plural, porque o renascimento
é para todos, não apenas para Nicodemos. E mais: “o espírito sopra (isto é,
age, reencarna, se manifesta onde quer), e não sabes de onde veio (ou seja, sua
última encarnação), nem para onde vai (qual será a próxima)”.
As palavras de Jesus foram de modo a
embaraçar Nicodemos, que indaga: “como pode ser isso”? E Jesus responde: “Tu
que (entre nós dois) és Mestre de Israel, te perturbas com estas coisas
terrenas? Que te não acontecerá então, se te falar das coisas celestiais
(espirituais)”?
Logicamente Jesus não podia esperar que
Nicodemos entendesse as interpretações mais profundas desse ensinamento, nem
tão pouco estava querendo ensinar-lhe o batismo, nesta passagem, como muitos
querem justificar.
Se o Cristo falava realmente do batismo para
Nicodemos, por que não o convidou a se batizar? E por que o próprio Cristo não
o batizou? Leia em João 4: 2 que Cristo não batizava, quem batizava eram os
discípulos. E por que diante de tantas curas, milagres e encontros, como no da
“Adúltera”, com “Zaqueu”, com o “Centurião”, com a “Cananéia”, Cristo nunca
falou em batismo? Não seria uma oportunidade para este convite? No entanto, sua
recomendação era para a mudança interior ou reforma íntima: “vai e não erres
mais para que coisa pior não te venha acontecer”.
E Jesus conclui exemplificando: “como Moisés
ergueu a serpente no deserto, assim o Filho do Homem será erguido da Terra”.
(Veja a história da serpente erguida no deserto no Livro de Números - vaicrá-
21: 4-9).
Aqui o Cristo prevê o que aconteceria com
Ele, ou seja, a sua morte na cruz para que hoje seja erguido na terra como o
filho de Deus e dirigente de toda a nação terrena.
Paulo, em sua epístola a Tito 3: 4-5,
interpreta bem esta citação do Cristo: “Mas quando apareceu a vontade de Deus,
nosso salvador, e o seu amor para com os homens, não por obras de justiça que
tivéssemos feito, mas segundo sua misericórdia nos salvou pelo lavatório da
reencarnação, e pelo renascimento de um espírito santo”.
Aqui, Paulo deixa bem claro que Deus nos
salvou não porque o tivéssemos merecido, mas por Sua misericórdia, servindo-se
da reencarnação a qual é um “lavatório” (de água) e um “renascimento do
espírito”. A palavra grega do texto a que se refere Paulo é “Palingenesia”-
isto é, “renascimento”, “Novo Nascimento”, REENCARNAÇÃO.
Passagem como essa deixa claro a importância
dos ensinamentos de Jesus para um judeu como ele, no entanto, estes
ensinamentos são de esperanças e da certeza do que ele afirma em Mateus 18:14:
“...Não é da vontade de vosso Pai, que está nos céus, que um destes pequeninos
se perca.”
Permaneçamos fiéis e confiantes nas promessas
do Cristo.
fonte: www.correioespírita.org.br
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