O espiritismo não trata de orientações sexuais
para além da heterossexualidade, nem poderia; à época de sua formulação, os
limites das ciências ainda bem estreitos eram para tanto. Kardec, porém, chegou
a ensaiar instigante tese no artigo inaugural da sua Revista de jan/1866. Disse
o mestre que o espírito se ressentiria da injunção do organismo, o que, segundo
ele, poderia modificar o caráter, por conta da submissão às exigências do
estado de encarnação. Essa influência não desapareceria logo após a morte; a
alma não perderia, pois, instantaneamente, a despeito de já livre, seus gostos
e hábitos terrenos. É assim que sucessivas encarnações num mesmo sexo poderiam
levá-la a fixar caráter masculino ou feminino, cuja marca nela ficaria
impressa. Só depois de atingir certo grau de adiantamento, a repercussão da
matéria no espírito desapareceria e, se assim posso dizer, também essa
sexualidade periférica, pois o espírito, em si, não teria sexo algum, donde
encarnar normalmente em ambas as polaridades a fim de lhes depreender
aprendizados. Se a rota dessa influência segue do corpo à alma, o mesmo se
verificaria da alma ao corpo. Desse modo, o caráter e as inclinações dos
espíritos, quando encarnados, viriam a constituir os homens e as mulheres,
avançados ou atrasados; razão pela qual concluiu Kardec: “Mudando de sexo, sob
essa impressão e em sua nova encarnação, poderá conservar os gostos, as
inclinações e o caráter inerentes ao sexo que acaba de deixar. Assim se
explicam certas anomalias aparentes que se notam no caráter de certos homens e
de certas mulheres”.
Essa tese não chegou a ser submetida ao ensino
geral dos espíritos. O que, no entanto, esse ensino consigna é que a encarnação
se verifica nos dois gêneros para que o espírito possa auferir-lhes a síntese
de experiências. Nosso condicionamento cultural, todavia, tem aposto o selo da
normalidade nesta via exclusiva de mão dupla para a libido: homens a mulheres e
vice-versa. Ora; Kardec chama o que disso se afasta de anomalia, é verdade;
contudo anomalia aparente. E por quê? Ele mesmo já o dissera. O espírito pode
conservar gostos, inclinações e caráter do sexo que haja ocupado por vidas a
fio e, assim, manifestá-los a despeito de nova e inversa condição física. Isso,
para Kardec, nada mais é que efeito esperado e, portanto, aparentemente
anômalo, porque corresponderia, na natureza, apenas a mais um entre tantos
nexos causais, cujo desvelo o mestre enxergou, de novo, no mais determinante
motor de seu pensamento filosófico, quase ausente nos espíritas
anglo-americanos: a reencarnação. Presumível consequência, então, do histórico
da causalidade espiritual. Tão só. Dessarte, Kardec não condena a
homoafetividade; tenta explicá-la. Nada lhe recomenda, por sinal, que já não o
faça a todo o gênero humano: desmaterialização dos hábitos, moderação dos
apetites grosseiros. Reprovar a homoafetividade? Forçar Kardec a reprová-la?
Nem uma coisa nem outra. Fraternalmente, amemo-nos uns aos outros, sem
distinção. A sensibilidade ética que sempre mais nos eleva, pelo senso de
justiça e compaixão que possamos vivenciar conforme Jesus: eis o que importa.
fonte: http://sergioaleixo.blogspot.com.br/2017/03/
É importante se tomar nota de que a reencarnação é lei de harmonia. Portanto, é natural que quando o indivíduo transita de uma potencialidade a outra - masculina ou feminina - poderá deixar traços de matizes variáveis hígidas, no arcabouço psicológico do reencarnante. É sobre isso que Kardec se refere, e não a busca que certos indivíduos procuram atender na área da sexualidade, com parceiros do mesmo sexo, ativa e passivamente. Esse entendimento leva aos espíritas a agirem como de hábito; com sentimentos de respeito indistintamente, presente o ensinamento de Jesus de nos amarmos uns aos outros.
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