A historiografia tradicional da Igreja romana
registra que foi no Mosteiro beneditino de Cluny, no sul da França, no ano de
998, que o Abade Odilon promovia a celebração do dia 2 de novembro, em memória
dos mortos, dentro de uma perspectiva religiosa. Somente em 1311, a “memória
dos falecidos” foi sancionada oficialmente em Roma e, posteriormente, em 1915,
Bento XV universalizou tal comemoração, dentre os católicos, expandindo e
consolidando a celebração até hoje.
Todavia, ajuizemos o seguinte: a ostentação dos
túmulos fúnebres determinada por familiares que desejam honrar a “memória do
falecido” ainda compõe o cardápio da soberba e orgulho dos parentes, que
intimamente propendem fundamentalmente “honrarem-se” a si mesmos. Nem sempre é
pelo “finado” que fazem todas essas demonstrações, mas por soberba, por apreço
às convenções mundanas e, às vezes, para exibição de abastança. Ora, é inútil o
endinheirado aventurar-se em eternizar a sua memória por meio de aparatosos mausoléus.
A comemorada visita ao túmulo, em massa, não
significa que venha trazer satisfação ao “morto”, até porque sabemos que uma
prece feita em sua intenção vale muito mais. Provavelmente a visita ao túmulo
seja uma maneira de demonstrar que se lembra do Espírito ausente, contudo é a
oração que abençoa o ato de lembrar; pouco importa o lugar se a lembrança é
determinada pelo coração.
Conhecemos diversas pessoas que requerem, antes
mesmo de desencarnarem, que sejam sepultadas em tal ou qual cemitério da elite.
Essa atitude, sem sombra de dúvida, demonstra deficiência moral, até porque
qual seria a importância de um pedaço de terra, mais do que outro, para o
Espírito moralizado?
O bom senso cochicha que faz sentido rememorar
com alegria e não lastimar os que já partiram, até porque eles estão plenamente
vivos noutras dimensões da vida. Realmente a ideia de falecidos é uma mistura
de alegria e dor, de presença-ausência, de festa e saudade. Porém, aos que
permanecemos na vida física, cabe-nos refletir e celebrar a existência com amor
e ternura, para depois, no além, quiçá, não amargar no remorso. Aos que
partiram enviemos nossa prece, nossa gratidão, nossa saudade, nosso carinho,
nosso amor!
Se formos capazes de orar, com quietude e
confiança, modificando a nostalgia em esperança, notaremos a presença dos
parentes e amigos desencarnados entre nós, envolvendo-nos em seus sentimentos
de gratidão, alegria e paz. Por este motivo e por muitas outras razões,
transformemos o “dia dos mortos” do tradicionalíssimo 2 de novembro em uma
experiência de veneração à vida, lembrando afetuosamente os que nos precederam
de retorno à pátria espiritual, e também festejando os que conosco ainda
peregrinam pelos logradouros da vida terrena.
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