sábado, 17 de fevereiro de 2018

ESPIRITISMO E POLÍTICA



             


             

              Peter Drucker (1909-2005), escritor, professor e consultor administrativo, visto como um dos maiores visionários do século XX, para os considerados efeitos da globalização, afirmou que se esse século confirmou alguma coisa, é a inutilidade da política. Para ele, é impossível creditar as transformações sociais do século XX aos eventos políticos criadores de manchete. Entende-se que a dinâmica da política partidária não gerou resultados sustentáveis para a sociedade como era de se esperar.
          Se se voltar a análise para o Brasil, esse quadro se torna mais dramático, principalmente nos dias atuais. Percebe-se, portanto, que essa conclusão não é privilégio de Drucker.
          É provável que esses fatores, somados a outros, sejam a determinante para que alguns espíritas se afirmem apolíticos e o tom da afirmação às vezes sugere que a política é “profana” para a Doutrina Espírita.

          Basta uma reflexão mais atenta e se percebe que o Espiritismo tem muito a ver com a Política, partindo-se da própria definição de política como uma referência permanente em todas as dimensões do nosso cotidiano na medida em que este se desenvolve como vida em sociedade. (...) a própria atividade política, longe de ser apenas voltada a uma transformação do “mundo objetivo” com vistas ao futuro, significa, também, o exercício de uma atividade transformadora da consciência e das suas relações com o mundo.
          Em O Livro dos Médiuns, cap. II:13, Allan Kardec assinala:

“Ora, o Espiritismo, que entende com as mais graves questões de filosofia, com todos os ramos da ordem social, que abrange tanto o homem físico quanto o homem moral, é, em si mesmo, uma ciência, uma filosofia, (...).”

No livro III de O Livro dos Espíritos, Allan Kardec trata das Leis Morais – Leis de Adoração, Trabalho, Reprodução, Conservação, Destruição, Sociedade, Progresso, Igualdade, Liberdade e de Justiça, Amor e Caridade. Estas leis são fundamentais para a compreensão e o relacionamento com o Criador, o planeta Terra, os seus semelhantes e as sociedades em que se está inserido.
Partindo desse prisma, é fácil até demais de se compreender que o Espiritismo, como filosofia, apresenta normas políticas ideais para o surgimento de uma nova sociedade, centrada na realidade imortal do Espírito.
Os Espíritos falando acerca da vida em sociedade, atestam que o homem não pode progredir sozinho, uma vez que não possui todas as faculdades desenvolvidas, daí necessitam do contato com os outros homens para atingir esse desiderato. Ora, essa ação não é nada mais do que um ato político. Quando o expositor espírita se posiciona no púlpito e fala sobre a necessidade de amar o próximo, isto é uma participação política. Por isso, Aristóteles admitiu que “O Homem é um animal político.”
A missão dos Espíritos encarnados está delineada na questão nº 573 de O Livro dos Espíritos, que não deixa de ser um ativismo político. Leia-se:

“- Em instruir os homens, em que lhes auxiliar o progresso; em lhes melhorar as instituições, por meios diretos e materiais.”

Em todo o corpo doutrinário do Espiritismo iremos encontrar indiscutível contribuição política, principalmente no seu aspecto filosófico, inestimável para que a sociedade planetária se torne funcional em termos de amor, justiça e caridade. Afirmaram ainda os Espíritos Reveladores na questão nº 917 de O Livro dos Espíritos:

“Quando bem compreendido, se houver identificado com os costumes e as crenças, o Espiritismo transformará os hábitos, os usos, as relações sociais.”

            O que se constata é que há uma interpretação equivocada do que são política e política partidária. A política partidária é a forma de se validar a participação na política. Tais partidos são resultantes de ideologias, objetivos, programas, de estatutos estabelecidos e que favorece ao agrupamento de homens que se identificam com esses valores. Comumente a política partidária descamba para o partidarismo que é a adesão cega a um partido ou grupo política, que conduz a atitudes parciais, descambado para o sectarismo político.
            Em decorrência da timidez dos bons – questão n° 932 de O Livro dos Espíritos – e das posturas intrigantes e audaciosas dos maus, a política partidária vem sendo ocupada pelos últimos. Por isso é de fundamental importância a participação dos bons na política para que se organize bons partidos políticos.
            Allan Kardec, em ensaio sobre As Aristocracias, em Obras Póstumas, adverte que os maus estão em minoria e ditam as leis aos bons. Ele elabora a seguinte equação:

“Admitamos que, em 100 indivíduos, haja 25 bons e 75 maus; destes últimos, 50 se contam que o são por fraqueza e que seriam bons, se observassem bons exemplos e, sobretudo, se tivessem sido bem encaminhados na infância; dos 25 maus, nem todos serão incorrigíveis. (...) No estado atual das coisas, os maus estão em maioria e fazem a lei para os bons; suponhamos que uma circunstância leve à conversão dos 50 medianos, os bons estarão em maioria e farão a lei por seu turno; sobre os 25 outros francamente maus, vários sofrerão a influência, e não ficarão senão alguns incorrigíveis sem preponderância.”

            O que se conclui é que o espírita tem que participar e influenciar na sociedade em que se encontra inserido, procurando interferir nas instituições que estruturam os valores e as normas do Espiritismo. Isto é uma participação política.
            Em nenhum momento o espírita deve levar a política partidária ou dar guarida a candidatos para a instituição espírita, mas deve estudar e reflexionar sobre os princípios político-filosófico-espíritas nela, criando uma interface com a dinâmica político-social da sociedade, pois eles estão contidos em O Livro dos Espíritos, no III livro, das Leis Morais.
            Se tiver vocação para o exercício da política, deve se filiar a uma agremiação partidária em que sua ideologia se afinize com os princípios espíritas, tomando consciência da sua responsabilidade nesse campo, e como parâmetro de que suas atitudes devem sempre estar voltadas para os o interesse do ser humano, em seus aspectos social e espiritual. Sua conduta no contexto político partidário deverá estar em consonância com os valores ético-morais do Espiritismo.
            É importante frisar que não há nenhuma valia a preocupação com a reforma íntima, isolando-se na casa espírita em postura meramente contemplativa.
          Indagados sobre à vida contemplativa, na questão nº 657 de O Livro dos Espíritos, Espíritos responderam:

“Não, porquanto, se é certo que não fazem o mal, também o é que não fazem o bem e são inúteis. Demais, não fazer o bem já é um mal. Deus quer que o homem pense Nele, mas não quer que só Nele pense, pois que lhe impôs deveres a cumprir na Terra. Quem passa todo o tempo na meditação e na contemplação nada faz de meritório aos olhos de Deus, porque vive uma vida toda pessoal e inútil à Humanidade e Deus lhe pedirá contas do bem que não houver feito.”





Referências bibliográficas

KARDEC, Allan.  A gênese. São Paulo: LAKE, 2010.
_____________.  O livro dos espíritos. São Paulo: LAKE, 2000.
_____________.  Obras póstumas. Rio de Janeiro: FEB, 1987.
MAAR, Wolfgang Leo. O Que é política. São Paulo: Brasiliense, 1982.
PAIVA, Aylton. O espiritismo e a política para a nova sociedade. São Paulo: Libertação, 1994.

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