“Quando orientas a proa visionária em
direção a uma estrela, e desdobras as asas para atingir tal excelsitude
inacessível, ansioso de perfeição rebelde à mediocridade, levas em ti o impulso
misterioso de um ideal. É áscua sagrada, capaz de te preparar para grandes
ações. Cuida-a bem; se a deixares apagar, jamais ela se reacenderá. E se ela
morrer em ti, ficarás inerte: fria bazófia humana.” (José Ingenieros)
As etapas da vida são como as estações do ano. O crepúsculo da vida é
comparado ao inverno, a estação fria, como se os cabelos brancos representassem
a neve fria sobre a terra. É momento oportuno para se fazer reflexões
filosóficas e delas se tirar aprendizados para consolidação do processo de conhecimento
de si mesmo e de compartilhamento das experiências. Não se deve temê-la.
Depois, os ciclos se renovam e virão novamente outros ciclos de estações,
através de novas existências no corpo, sempre começando pela primavera da
infância.
Esse ebuliente ciclo social que o Brasil
atravessa serve de laboratório para o indivíduo fazer leituras e releituras do
cotidiano. As provocações filosóficas são as mais diversas.
Trabalho empírico foi realizado em uma equipe de trabalho, através de
empresa gestora de conflitos. No texto compartilhado no grupo, foram abordadas
questões fictícias, mas similares às que envolviam o grupo. Apenas 19% se
manifestou sobre as situações, mas com abordagens destoantes do que os
problemas exigiam. As colocações ou eram clichês, ou repetições inócuas,
dogmáticas, sem nenhum substrato que ampliasse a discussão que o tema se
propunha. Os que se identificaram com a situações-problemas, optaram em
descambar para as questões de ordem pessoal, sem se deterem no campo das
ideias. O professor de política da Universidade de Harvard (EUA), Michael
Sandel, classifica esse fenômeno, como “terceirização das ideias”. “Terceirizar
ideias é fugir do debate.” E nesse tangenciamento, problemas cruciais, como
corrupção, negligência, incompetência, sabotagem e chantagem emocional, ficam
restritos somente ao âmbito político e não pessoal e coletivo.
O retrato dessa dura realidade está no resultado da pesquisa Indicador
de Alfabetismo Funcional, conduzida pelo Instituto Paulo Montenegro em parceira
com a ONG Ação Educativa, que aponta que apenas 22% dos brasileiros que
chegaram à universidade têm plena condição de compreender e se expressar. Entre
os 70 países avaliados, o Brasil ocupa a 59ª posição em termos de leitura e
interpretação.
Ao se perder o hábito de se permitir ouvir a ideia espelhada pelo outro,
não necessariamente para se chegar a um acordo, mas para raciocinar e refletir
sobre a vida, o meio e as mudanças que se necessita, contribui-se efetivamente
para esse ciclo de negatividade moral, ética e espiritual.
Imperativo notar que na medida em que a experiência humana alcança novos
paradigmas, ao se observar a realidade, as ideias vão se modificando pela
imaginação, que é plasticizante e jamais se acomoda.
Uma nação, se é que podemos dar esse título ao Brasil, não chega a esse
ápice de adormecimento de valores morais por acaso. Vê-se que os apetites xenofóbicos,
misóginos, homofóbicos e fascistas tornaram-se dominadores e vorazes e mesclam as
relações cotidianas dos brasileiros.
José Ingenieros(1877-1925), médico, psiquiatra,
psicólogo, farmacêutico, escritor, docente, filósofo e sociólogo
ítalo-argentino, define esse estágio civilizatório como mediocracia, que
segundo ele:
“Quando o ignorante se julga igualado
ao estudioso, o velhaco ao apóstolo, o falador ao eloquente e o mau digno, a
escala do mérito desaparece numa vergonhosa nivelação de vilania. A mediocracia
é isso: os que nada sabem, julgam dizer o que pensam, embora cada um só consiga
repetir dogmas, ou auspiciar voracidades.”
Não mais democracia. Não meritocracia. Nem mediocracia, que os filósofos
preferem denominar “mesocracias”. (1) Mas sim, a mediocracia que
quando a verdade deixa de ser útil e entra em penumbra, e se destempera tudo
que está a caminho da virtude e da dignidade. As coisas do espírito são
desprezadas.
Destacam-se, nesse desiderato, as personalidades que sofrem de
umbiguismo, ou seja, todas as suas demandas estão orientadas para o seu umbigo.
Além de serem orientadas pelo ego, há nelas marcas que se fixaram no período do
narcisismo infantil, o que é normal nas crianças, mas não no adulto.
O medíocre sonega impostos, fura fila, tenta subornar policiais ou
autoridades; o propósito é levar vantagem em tudo. O indivíduo medíocre não
dialoga, disputa e por divina força tem que sair vencedor.
Na mediocracia os países deixam de ser pátrias e o povo passa a ser uma
nau náufraga, ou uma massa humana em disparada como um rebanho bovino. E aí,
salve-se quem puder! É o ápice do egoísmo.
Ora, o egoísmo é marca determinante na personalidade, derivada do
processo da construção da individualidade, mas que gradualmente o Espírito
encarnado terá que se desfazer nas vivências sucessivas, pelo processo de
individuação, que é a iluminação do lado sombrio da individualidade.
Na questão nº 833 de O Livro dos Espíritos, está escrito que é pelo
pensamento que o homem goza de uma liberdade sem limite, porque o pensamento
não conhece entraves. Portanto, o pensamento é atributo do Espírito, e pensar é
uma arte. Não é à toa que Allan Kardec afirma que o espírita é um livre-pensador.
Um dos principais processos do pensar do indivíduo é a abstração, pelo seu
intelecto extra das realidades sensíveis e sua essência inteligível e
universal.
Os Espíritos ao atestarem na questão 822 de O Livro dos Espíritos que a
felicidade relativa na Terra como condicionante moral e a fé no porvir,
consolida que essas abstrações são elaboradas e só consolidadas como
aperfeiçoamento evolutivo se as experiências surgirem como proveitosas, e são
proveitosas, porque são instruídas pelo ideal espírita. E isso proporcionará a
autonomia ao educando, pois ele passará a agir, por si só, representado por
conceitos éticos e morais espíritas.
A mediocridade é contagiosa, assim como o egoísmo. O Espírito Fénelon,
respondendo à questão nº 917 de O Livro dos Espíritos, assim se expressa:
“É o contato que o homem experimenta
do egoísmo dos outros que o torna geralmente egoísta, porque sente a
necessidade de se pôr na defensiva. Vendo que os outros pensam em si mesmos e
não nele, é levado a se ocupar de si mesmo mais que dos outros.”
Assim também com a mediocridade. Isso faz lembrar Oscar Wilde
(1854-1900), poeta e dramaturgo irlandês que advertia:
“Ah! Não me diga que concorda comigo!
Quando as pessoas concordam comigo, tenho sempre a impressão de que estou
errado.”
Wilde apresenta o antídoto para a
mediocridade.
Sêneca,
um dos mais célebres intelectuais do Império Romano, em sua obra Da Vida Feliz,
dedicada a seu irmão Gallio, quando o ensina a buscar a felicidade, ele escreve:
“Ora, nada nos enreda em maiores
males do que o fato de agirmos conforme a voz comum.”
Veja o que diz o Apóstolo Paulo, em sua Epístola aos Romanos – 12:2 –,
também prevenindo contra a mediocridade:
“E não vos conformeis com este mundo,
mas transformai-vos pela renovação do vosso entendimento, para que
experimenteis qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus.”
O próprio Jesus, conforme narra o evangelista João – 15:18-20 –
evidencia que as belas atitudes dos seus discípulos, contrariam inimigos,
considerando-se que a mediocridade faz o indivíduo popular. Leia-se:
“O mundo amar-vos-ia se vocês lhe
pertencessem; mas vocês não lhe pertencem. Eu vos escolhi para saírem do mundo,
e por isso o mundo vos odeia.”
Em Mateus – 5:37 –, Jesus é mais severo: que sua mensagem não seja de palavras
vãs, mas atitudes concretas para a renovação do mundo:
“Seja, porém, o vosso falar: Sim,
sim; Não, não; porque o que passa disto é de procedência maligna.”
Fuja-se da mediocridade!
(1)
Governo ou influência da classe média.
Referências:
IDE, Pascal. A arte de pensar. São Paulo:
Martins Fontes, 2000.
INGENIEROS, José. O homem medíocre. Rio de
Janeiro: Getúlio Costa, 1944.
KARDEC, Allan. O Livro dos espíritos. São Paulo: LAKE, 2000.
SÊNECA. Da
vida feliz. São Paulo. Martins Fontes. 2001.
Pecado sem Perdão. Reflexão.
ResponderExcluirCansativa, principalmente para os conscientes.
Em expiação aguardam e sofrem os carentes.
Mas, democracia pede para sermos pacientes.
O político disse: a inteligência é pecado sem perdão,
Quando mediocridade tem poder de decisão.
Em certos dias, me parece uma boa explicação.
Democracia não garante eleição dos melhores.
Mas, é sistema para impedir reeleição dos piores.
Num momento em que os Partidos buscam se aproximar de eleitores cristãos, um vereador conduziu dezenas de pessoas a entrar à força numa igreja em Curitiba. Seu ato transformou-o em “Taubua de tiro ao alvaro”. (*)
https://www.gazetadopovo.com.br/vida-e-cidadania/invasao-igreja-curitiba-criticas/
“Espíritos grandiosos sempre encontram oposição violenta de espíritos medíocres.”
https://www.recantodasletras.com.br/mensagens-de-otimismo-fe-esperanca/7319077
(*) “Taubua de tiro ao alvaro”. https://www.youtube.com/watch?v=P0YRNjD0MC0