Os 13 porquês – como conversar sobre
suicídio, estupro, drogas e bullying com seus filhos adolescentes
A história narrada na série Os 13 Porquês (13
Reasons Why) mostra primeiros beijos, o nascimento e o fim de amizades, os
estereótipos de diferentes grupos de jovens, a necessidade de fazer parte e se
sentir aceito, a dificuldade e inabilidade social, o julgamento, a fofoca. Esse
é o cenário adolescente que leva Hannah, a personagem principal da série, ao
suicídio.
A discussão mundial sobre a série tem tomado
as redes sociais e mobilizado especialistas, organizações que apoiam a
iniciativa da série de trazer à tona um tema tabu, ou que acusam o seriado de
apologia ao suicídio, alegando inclusive um aumento no número de casos depois
da estreia. O certo, independente da série, é que a OMS classifica o suicídio
como problema de saúde pública, em 2016 estudos registraram que cerca de 800
mil pessoas por ano morrem nessas condições, o que, segundo a campanha
deflagrada por essa organização, é preciso uma mobilização de vários setores
para melhorar esse tipo de ocorrência; segundo a OMS o problema é complexo mas
pode ser tratado.
Tanta exposição e polêmica tem aguçado a
curiosidade dos adolescentes. Por isso, resolvemos fazer uma maratona com
nossos filhos de 15 e 17 anos, que estão no ensino médio.
A história é perturbadora. O suicídio de
Hannah é apenas o ponto mais dramático de um cenário profundamente distorcido.
Uma cultura de estímulo ao egoísmo que, de um lado, leva os adolescentes a
verem apenas o que lhes interessa momentaneamente, e de outro lado que resulta
em pais ausentes e inseguros, com medo de invadir o espaço dos filhos,
sufocados por um sistema social e econômico perversos. O bullying, o machismo,
o dinheiro, o abuso de substancia tóxicas, o sexo, o culto à aparência e a
inconsciência em relação a todas essas coisas são alguns dos temas que a série
aborda. Ainda há outras camadas de análise que não se limitam aos itens
listados acima, como o papel a instituição escolar e o sistema judicial.
Assistimos em blocos de três episódios por
vez (são 13 no total). Cada um conta a relação de um outro personagem com
Hannah, mostrando a influência dos mal entendidos, das decisões egoístas e da
falta de comprometimento desse círculo social na decisão fatal da protagonista.
O efeito borboleta, onde uma pequena ação vai tomando proporções cada vez
maiores e incontroláveis é muito bem construído na narrativa e nos faz pensar
sobre a nossa responsabilidade por aquilo que cativamos (para citar o Pequeno
Príncipe). A série deixa claro que, para o bem ou para o mal, ninguém vive sem
responsabilidades pelo que faz.
As dificuldades de comunicação entre os
adolescentes têm um contraponto interessante nas Aulas de Comunicação que a
escola oferece. Lá, os alunos aprendem a importância de fazer elogios,
expressarem seus sentimentos, serem honestos e diretos, a construírem
relacionamentos. Contudo, as Aulas de Comunicação se apresentam estéreis diante
da necessidade de contato humano dos alunos, seja com pais que não oferecem
suporte emocional para seus filhos, seja com amigos que ainda não possuem
maturidade para uma série de problemas, ou, finalmente, pela complexidade das
instituições, no caso a escola, que se blinda legalmente no relacionamento com
os alunos e deixa a porta aberta do abandono de si mesmo aos alunos.
A série expõe o quanto os jovens estão ainda
em formação e como um ambiente problemático pode afetar a organização mental
deles. Fora o caos da história, há em uma das camadas do enredo a preocupação
em melhorar essa etapa da vida por meio de um diálogo verdadeiro, de
acolhimento real, de comprometimento e tudo que possa ajudar o jovem em sua
formação social, cultural, e intelectual.
As partes explosivas da série, em que são
mostrados casos de estupro (acontece mais de um estupro na história), e o
suicídio propriamente, são filmadas de forma a causar desconforto e repulsa no
espectador. Uma das críticas feitas à série é exatamente a literalidade com que
essas cenas foram feitas e que isso poderia ser usado como um modelo a ser
seguido (principalmente o suicídio). No final da série, existe um episódio extra
onde os produtores e atores das filmagens e dos momentos mais impactantes falam
sobre o tema do suicídio e justificam essa crueza dessas cenas, argumentando
sobre a importância de se falar sobre o assunto sem reservas.
Essa discussão das cenas exibidas deve agitar
os canais de discussão por muito tempo. De nossa parte, podemos dizer que não
vimos a cena do suicídio, pulamos a cena, julgamos não ser necessária, fosse
pela dramaticidade que seria imprimida à filmagem, fosse pela violência do ato
em si.
Depois da maratona, as discussões da família
foram muito boas. E não ficaram apenas concentradas nos traumas e no
consequente suicídio de Hannah, mas passaram pela história de todos os
personagens, seus fardos, seus modos de ver o mundo, de pensar e agir. Para
nós, pais de adolescentes, foi o momento de ter uma conversa profunda sobre as
causas, mais do que só sobre os efeitos. De como se, numa cadeia de ações e
escolhas, de respostas impulsivas e omissões, talvez se uma só das causas
tivesse sido quebrada, o resultado poderia não ter sido trágico. O conversar
sobre o suicídio levou-nos a falar sobre a vida, sem reservas, de suas delícias
e pesadelos, para que o suicídio deixe de ser opção para aquele que está
convicto que não há mais sentido para a vida, o transcorrer dos dias abrem
novos caminhos a serem trilhados, mesmo que se precise, e não deve ser uma
opção a ser descartada, de ajuda profissional médica, além do amor e carinho
das pessoas no entorno.
Mas é importante frisar que a série é
bastante intensa. Não recomendamos que os adolescentes assistam sem nenhum tipo
de supervisão, sem que possam conversar sobre o que a série apresenta com
outras pessoas (de preferência adultos). A série deixa claro que se não existe
comunicação constante, ninguém sabe o que se passa na cabeça do outro, suas
alegrias ou tristezas, seus medos ou seus anseios. Ver e ouvir o outro é a
única maneira de aliviar a pressão causada por ideias pré-concebidas (rótulos),
e por traumas e dores profundas. Assistir à série junto com os adolescentes e
deixar que eles elaborem e compartilhem suas percepções e conclusões é uma
excelente estratégia para falar de temas difíceis, mas fundamentais.
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