Em sânscrito, karma significa “ato
deliberado“. Nas suas origens, a palavra karma significava “força” ou
“movimento”. Apesar disso, a literatura pós-védica expressa a evolução do termo
para “lei” ou “ordem”, sendo definida muitas vezes como “lei de conservação da
força“. Isto significa que cada pessoa receberá o resultado das suas ações. É
um mero caso de causa e consequência. [1]
O Espiritismo esclarece que o sofrimento
atual não está obrigatoriamente relacionado às nossas ações erradas (“pecados”)
do passado, porém ao estado de imperfeição moral mantido no presente. Logo,
sofremos nesta atual encarnação em virtude da imperfeição da qual ainda não nos
libertamos, e não por causa de atos errados (“pecados”) atuais ou de outras
encarnações.
Conta-se que um sofrimento desta vida, se não
tem causa visível, estará certamente na vida anterior. Por esta razão
defende-se o princípio do carma, ou causa e efeito, ou inadequadamente de “ação
e reação”. Mas não é esse o preceito revelado pelos espíritos superiores, até
porque é uma ingenuidade crer que o carma ou “pecado” é o princípio que Deus
estabeleceu como regras que devem ser obedecidas pelos indivíduos, caso
contrário serão “castigados”. Contudo se forem obedientes serão recompensados.
Ninguém sofre tão-somente para “pagar” a ação
errada do passado. A nossa dor não é uma reação a nada, mas uma ação, pois
sofremos necessariamente pela causa da liberdade e não “por causa” dela. Allan
Kardec faz ligeira alusão ao termo causa e efeito e jamais citou o termo
“carma” para pesquisar e esclarecer as razões da dor e das aflições. Portanto,
o “carma” não foi mencionado em nenhum momento por Kardec ou pelos Benfeitores
espirituais. Além do mais, a reencarnação jamais será um processo punitivo.
Renascemos para progredirmos. Se sofremos, de vez em quando, é pela causa que
abraçamos livremente e não inapelavelmente por causa de alguma desobediência às
leis divinas.
Na pergunta nº 132 do Livro dos Espíritos,
Kardec questiona sobre qual seria o objetivo da encarnação. A resposta é clara:
“A lei de Deus impõe a encarnação com o objetivo de chegarmos à perfeição …”.
Em nenhum momento aparece a palavra amargura, fardo, dor ou qualquer outro
termo que signifique “carma”. Pelas
sucessivas existências, mediante nossos esforços e desejos de melhoria no
caminho do progresso, avançamos sempre e alcançamos a perfeição, que é a nossa
destinação final”. [2]
“Os sofrimentos devidos a causas anteriores à
existência presente, como os que se originam de culpas atuais, são muitas vezes
o efeito da falta cometida, isto é, o homem, pela ação de uma rigorosa justiça
distributiva, sofre [“muitas vezes”] o que fez sofrer aos outros. Se foi duro e
desumano,poderá ser a seu turno tratado duramente e com desumanidade; se foi
orgulhoso, poderá nascer em humilde condição; se foi avaro, egoísta, ou se fez
mau uso de suas riquezas, poderá ver-se privado do necessário; se foi mau filho,
poderá sofrer pelo procedimento de seus filhos, etc.” [3] Evidentemente as
expressões “muitas vezes” e “poderá” relativiza o processo da lei e não afirma
que a dor seja sempre uma penalidade. Até porque as leis de Deus não são
punitivas.
O livre-arbítrio é a nossa grande ferramenta
evolutiva, inexistindo, pois, determinismos e fatalidades. A fatalidade existe
apenas na escolha que fazemos ao reencarnar e suportar esta ou aquela prova. E
da nossa escolha resulta uma espécie de destino, que é a própria consequência
da posição que escolhemos e em que nos achamos. Falamos das provas de natureza
física porque, quanto às de natureza moral e às tentações, ao conservarmos
nosso livre-arbítrio quanto ao bem e ao mal, seremos sempre senhores para ceder
ou resistir…”. [4]
Atingido o patamar evolutivo de nos integrar
ao reino humano conquistamos gradualmente a faculdade do livre arbítrio.
Apoderamo-nos da liberdade como a grande alavanca da evolução. A liberdade de
escolher nosso próprio destino, todos os dias, torna-se o diferencial entre nós
e os animais inferiores, que ainda não podem discernir entre o bem e o mal, o
certo e o errado, o moral e o imoral.
Expõe Kardec que a Lei de Deus está gravada
na consciência de cada um. Desta forma, identificamos o porquê da liberdade de
consciência, e da sua progressividade à medida que a realizamos em nós. [5]
Deus é amor, não existe nada fora de Deus; portanto deduzimos que não existe
nada fora do amor. O que é contrário à Lei de Deus, na realidade não existe de
forma absoluta. As nossas escolhas transportam na essência as implicações boas
ou ruins.
Em síntese, sofremos as consequências
naturais de todas as imperfeições que não conseguimos corrigir, mas não porque
“pecamos” no passado. O nosso estado, feliz ou calamitoso, é intrínseco ao
nosso estado de pureza ou impureza. Por isso, não devemos procurar em Deus a
imunidade das nossas dificuldades, mas exoremos a força necessária para
superá-las. Notando que no mundo espiritual não há qualquer código que puna ou
premie, por lá vigora a “Lei da Escolha das Provas”, e não “Lei de Causa e
Efeito” com atributos punitivos. O espírito sempre escolherá o que ele irá
enfrentar no futuro, como meio de seu desenvolvimento moral e intelectual.
Referências
bibliográficas:
[1] Disponível em
https://www.significados.com.br/karma/
acesso 02 de dezembro de 2018
[2] KARDEC, Allan. O Livro dos
Espíritos. 50a ed., Rio de Janeiro: Ed. FEB, 1980, questão 132
[3] KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo
o Espiritismo., Capítulo V – Rio de Janeiro: Ed. FEB, 1975
[4] KARDEC, Allan. O Livro dos
Espíritos. 50a ed., Rio de Janeiro: Ed. FEB, 1980, questão 851
[5] Idem, questão 621
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