sexta-feira, 8 de novembro de 2019

LAMENTO MATINAL





Estou alimentada, mas e quem não comeu hoje?
Estou abrigada, mas e quem está nas ruas? Estou em paz, mas e quem está fugindo da guerra?
Estou cuidada, mas e quem morre na fila do hospital?
Estou esperançada, mas e quem já perdeu a vontade de viver?
As crianças que eu amo estão acolhidas, mas e as que estão abusadas, violentadas e fugidas?

O meu jardim está florido e minha horta cultivada, mas e as florestas queimadas e o mar violado de óleo?
Meu corpo está coberto e agasalhado, mas e os que se cobrem de farrapos?
O que fazer com minha compaixão impotente, meu contentamento descontente, minha empatia perplexa?
Nem consigo agradecer o que tenho, porque não consigo multiplicar o que me privilegia...
Não consigo sossegar no meu jardim, porque não consigo estendê-lo para o mundo.
Só me restam a migalha que dou, a lágrima que me cai, a consciência que semeio, a poesia que clamo e a oração que elevo.
Mas é pouco, muito pouco!
E me pergunto como pode alguém trancafiar milhões de moedas inúteis, enquanto seus irmãos têm fome de alimento e educação?!
Como pode alguém se exibir com carros milionários nas ruas esburacadas e entre crianças abandonadas?
Bem disse o Mestre que seria mais fácil um camelo passar pelo fundo de uma agulha do que um rico entrar no Reino dos Céus.
Eu só estou ansiando e sonhando para que o Reino se faça hoje, aqui!

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