A chegada dos imigrantes no Brasil, no século XIX |
Em estudo recente promovido pela Universidade
Livre Pampédia, em um EAD que discutiu o livro de Zygmunt Bauman, A ética é
possível numa sociedade de consumidores?, foi uma surpresa para mim o autor
estudado destacar a necessidade de tornar o planeta hospitaleiro para a Europa
e a Europa como promotora dos valores da hospitalidade.
Ele cita o texto clássico de Kant sobre a paz
mundial, que é um dos textos básicos dos estudos sobre hospitalidade, também
mencionado por Derrida, um dos sociólogos e filósofos mais aguerridos, que
defende o conceito da hospitalidade incondicional.
O conceito de hospitalidade não está só
ligado ao bem receber, é um conjunto de ritos entre o convidado e o anfitrião,
que pode ter lugar em vários níveis, desde família, até países, veja o caso da
onda de refugiados vagando sem destino pela Europa! Esses ritos geram no fim
das contas relações sociais que se desdobram e marcam profundamente uma
sociedade.
Ao ler o texto, peguei O Livro da
Hospitalidade – A Acolhida do Estrangeiro na História e nas Culturas, da
Editora SENAC, organizado por Alan Montadon, com prefácio à edição brasileira
de Luis Octávio de Lima Camargo para verificar o que havia de estudos em
relação à escola. Surpreso, nada encontrei! O livro tem um capítulo dedicado às
instituições, mas não fala sobre escola, podemos encontrar sobre hospitais,
hospedarias, hospícios e orfanatos, mas nada ligado às escolas.
Um esquecimento ou escolas são lugares desde
sempre inóspitos ou, melhor, hostis? Os ritos da hospitalidade podem criar
relações de acolhimento ou de hostilidade; Mauss, o primeiro teórico da fala da
trindade da hospitalidade: dar, receber e retribuir coloca a aplicação dessa
trindade como algo virtuoso para os envolvidos no processo, mas a quebra dele
gera hostilidade.
Pois bem, a escola sempre foi um fardo para
os governos, a iniciativa privada ao tomar esse fardo para si cria novos
problemas, pois a educação vira um produto, uma relação comercial e não
propriamente social no sentido pleno do engajamento aluno-professor. Ao
colocarmos esse engajamento pessoal fora desse círculo e estendermos para o
conceito de universalidade da educação, os governos mais querem ficar longe
desse problema e as instituições privadas mais querem volume para melhorar as
margens do negócio.
Assim, percebe-se que, historicamente, a
escola ficou fora da percepção de uma instituição regida por virtudes maiores,
sendo a solidariedade umas das mais destacadas, principalmente até a primeira
metade do século XX, quando a miséria era gritante, mesmo em países da Europa,
quando se verificam teorizações sobre hospitais e orfanatos em estudos ligados
à hospitalidade, a mesma que Bauman indica como um caminho de superação da
apatia das gerações que se perdem no que ele chama de modernidade líquida.
Se uma escola não desenvolve o tema
hospitalidade, como a hospitalidade poderá se apresentar de forma efetiva como
uma das ferramentas/ teorias de superação do impasse moderno e/ou pós-moderno?
O recrudescimento do racismo, do
fundamentalismo religioso e político são sintomas que deixam claro que o outro
não está sendo visto, o que interessa é meu bem-estar, dessa forma tudo que
possa ofuscar a chance de meu ganho, de meu prazer, e de minha segurança deve
ser contido (senão eliminado). O resultado pode ser a perda histórica de
milênios de construções de respeito de um para com o outro, de uma família para
com outra, de um país para com o outro; em resumo, a perda dos sistemas de
relações sociais em que o anfitrião e o convidado buscam se entender em uma
situação delicada para ambos, mas que tem que ser superada com sucesso.
A escola como espaço deve ser um ambiente de
hospitalidade por natureza, e os alunos precisam se apropriar desse ambiente
para transcender e influenciar o mundo com pensamentos focados no outro e
perspectivas de longo prazo.
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