Isaac Asimov (1920 – 1992) foi um professor
de bioquímica na Universidade de Boston, nos Estados Unidos. Sua notoriedade,
no entanto, está ligada à literatura como um dos maiores nomes da ficção
científica. Seus livros falam de tecnologia num futuro em que os robôs convivem
com a humanidade ombro a ombro.
Acabei de ler o livro Robôs (The Naked Sun –
1956), cuja narrativa se desenvolve num planeta ocupado por exploradores
terrestres que, ao longo do tempo, foram se isolando um do outro, vivendo em
suas grandes e produtivas propriedades cuidadas por robôs. O contato social
acontecia somente por engenhoso sistema de vídeo que colocava dentro da casa de
um morador o outro, como um holograma. Com o passar dos séculos, a maioria dos
habitantes do planeta não concebia como positiva a ideia de ter contato com
outro humano, pelo contrário, era considerado ultrajante.
Em tempos de redes sociais, mensagens de
texto, voz e trocas de vídeos, é curioso pensar que há cerca de setenta anos
atrás, sem qualquer ideia do que seria a tecnologia em nossos dias, alguém pôde
visionar problemas do não convívio pessoal.
Hoje, pode-se vislumbrar que estamos num
estágio inicial em que ferramentas tecnológicas estão afastando as pessoas do
convívio direto. Nota-se que há problemas com essa nova situação, desde
entender o que é estar disponível para alguém a quilômetros de distância até
visitar alguém na porta ao lado, ao invés de enviar uma mensagem de texto.
Outro ponto interessante do momento em que
vivemos e que podemos comparar com o livro é a forma de contato entre as
pessoas, totalmente tecnológica. Porém, no livro, as pessoas tinham ferramentas
que as ligavam ponto a ponto, com o mínimo de intermediação, como o tradicional
sistema telefônico. Atualmente, utilizam-se intermediários (aplicativos em
smartfones) que se colocam de forma ostensiva na comunicação, inclusive com
coleta de dados e estudo de hábitos sociais e econômicos dos usuários. Isso
possibilitou o desenvolvimento de sistema de coleta de dados chamado de Big
Data, ou seja, um incrível banco de dados mundial em que as empresas de
tecnologia e comunicação se tornam cada vez mais donas das pessoas.
Assim, temos dois problemas a entender, o
isolamento dos indivíduos e empresas tomando conhecimento detalhado dos nossos
hábitos.
George Orwell, no livro 1984 (de 1948), apresenta
uma sociedade em que a comunicação direta entre as pessoas é esvaziada, o
Estado torna-se todo poderoso quanto consegue que o sentido coletivo da
sociedade seja suprimido do dia a dia. Cresce assim a influência e controle do
Estado na vida de cada cidadão, e a vida passa a ser vazia. O livro, nesse
caso, fazia alusão aos sistemas totalitários, e ainda não vislumbrava o que se
tornaria o poder econômico das grandes corporações. Mas independente de quem
exerce o poder, Orwell nos mostra que a principal arma de controle é a
manipulação da informação.
O Big Data em si é um assunto novo, que ainda
nem mesmo consolidou uma definição do que seria de fato, porém o uso das
informações coletadas, principalmente pelas empresas de comunicação, desde do
inocente GPS veicular até a postagem numa rede social, tem suscitado debates.
Qual a exercício da autonomia numa sociedade futura onde a desfragmentação do
conceito de coletividade já está em processo de consolidação (com o isolamento
individual e em grupos/bolhas), onde uma pessoa vive dentro de sua ilha de
conforto e tudo que não se sintonizar com ela é excluído automaticamente por
dezenas de filtros tecnológicos?
A narrativa do livro de Asimov apesar de
simples – por muito tempo ficção científica foi tratada como um subproduto da
literatura – apresenta várias camadas do que vivenciamos hoje, como o
entendimento do que é real, a organização político-social, o uso consciente da
tecnologia, o ser humano como ser social, o que é privacidade, etc. Contudo, no
fim, o que fica de lição é a necessidade de se olhar o humano como humano, com
todas suas belezas e problemas, sem qualquer supremacia biológica (no caso do
livro) ou econômica (nos dias atuais).
Trazendo essas reflexões para a educação, um
dos pontos é que o uso da tecnologia não deve contribuir para o isolamento
físico e social dos jovens. As ferramentas e sistemas a serem utilizados devem
priorizar a interação real, com toque, olho-no-olho, reconhecimento de reações
emocionais e etc, sem esse aprendizado e treino, os adultos da era tecnológica
podem se tornar frios e se desgarrar mais facilmente do convívio.
O outro ponto é em relação às manipulações
possíveis a partir do uso das informações colhidas pelos intermediários
tecnológicos. O uso que se fará com o conceito de Big Data poderá ser positivo
ou negativo para a sociedade a partir do viés de manipulação daqueles que
processarem esses dados. A educação precisa ao mesmo tempo mostrar como essa
manipulação se dá (para que possamos identificá-la), e nos mostrar o peso da
responsabilidade que tem o uso que fazemos das informações.
Quanto maior o distanciamento entre as
pessoas, maior a desconfiança entre as partes, mais a manipulação da
informação. Precisamos de uma educação que possa transcender o contexto sóciopolítico
e os interesses econômicos do momento e que acredite que o ser humano é bom e
que merece respeito em sua individualidade e singularidade.
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