Há conceitos que geram controvérsias desde sempre. O conceito de Justiça é um desses. A ideia contemporânea de relativizar tudo, muitas vezes confunde, pois estabelece um entendimento de que tudo é relativo. A Justiça, no entanto não devia ser tida como relativa.
Diversas vezes os emissários espirituais que orquestraram a Codificação afirmaram que cabia aos encarnados se entenderem quanto aos conceitos com os quais lidam a todo o momento. Uma narrativa, qualquer que seja, mormente quando se ocupe uma posição em sociedade, e cada pessoa ocupa, exige cautela e bom senso. Estar desperto aos processos civilizatórios exige atenção às práticas nos diversos segmentos sociais para interpretar, além das palavras, o que sugerem as ações. Entender a realidade supõe ter base em princípios, como se fossem prismas. A Doutrina Espírita se propõe como um conjunto de princípios.
Fundamental não se confundir Justiça com justiçamento. A primeira se traduz como “Prática e exercício do que é de direito, conformidade com o direito, equidade e bondade” (dicionário Priberam) e seu executante chamado de justo. A segunda traduzida por “ato ou efeito de justiçar, de punir com a morte” (idem) e seu executante conhecido como justiceiro.
O Livro dos Espíritos reserva um espaço importante para a análise do tema quando trata da Lei de Justiça, Amor e Caridade. Isso pode ser visto na questão 875 que se segue: “Como se pode definir a justiça? – A justiça consiste no respeito aos direitos de cada um”. Discussão que se estende à questão seguinte ao ser afirmado – “o Cristo vos disse ‘querer para os outros o que quereis para vós mesmos’”.
Por que todas as filosofias deístas afirmam que Deus é Justo e não proferem que Ele seja justiceiro? Provável que entendimento é de que Deus siga regras, mesmo que não as conheçamos minimamente. Logo se admite que Ele não utilize leis que persigam alguns grupos de pessoas e beneficiem outros de forma arbitrária e parcial. Para ser Justo necessariamente haverá de ser imparcial.
São esses princípios que vale a pena discutir quando consideramos a época difícil que se abate sobre o planeta. Um passeio no Sermão do Monte (Mateus capítulos 5, 6, 7) pode ser cuidado restaurador às oscilações de humor diante das situações de violência que adentram a vida das pessoas cotidianamente. No capítulo 6 (v.33), Jesus ensina: “mas, buscai primeiro o reino de Deus, e toda a sua justiça, e todas estas coisas vos serão acrescentadas”.
Norteados pelo prisma que a Doutrina Espírita nos propõe, mercê dos princípios consolidados pela ética moral de Jesus, urge que haja atenção redobrada sempre que nos virmos diante de situações que se desgarrem da justiça para gerar justiçamento. A certeza de que ocupamos um planeta que serve de casa para um universo de Espíritos imperfeitos é um convite para reforçarmos o desejo de seguir pelas regras da justiça e da caridade. É preciso ter em mente que não são as regras que fazem homens de bem nem os tratados de paz que evitam as guerras, mas quando são ultrajadas as regras e rasgados os tratados a humanidade dá um passo atrás e se arrisca a cair da barbárie. Na barbárie vale apenas a lei do mais forte, não necessariamente a lei do mais habilidoso para a construção do bem. E se a barbárie atinge àquele que está ao lado também pode atingir a todos ao derredor.
Vale a pena consultar a consciência diante de tantos delitos que campeiam no mundo. Entender que a justiça não deve ser relativizada pode ser exatamente o caminho que precisamos começar a caminhar, apesar dos que ainda não despertaram para a mesma opção. E estar desejosos de que a justiça que nos alcança seja a mesma que lhes propomos.
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