Por Ana Cláudia Laurindo
Dona Isabel foi entre outras coisas que amava, uma benzedeira.
Trazer sua memória nestas linhas é eleger sua imagem como representação de tantos outros espíritos fiéis à fé na misericórdia de Deus, Jesus, Maria e todos os santos, para curar os males que na Terra afetam ricos e pobres, pois a benzeção não tem classe social.
Conheci muitos, por todos eles, fui benzida! Olhado, olho gordo, quizilas diárias eram retiradas com a força das folhas de arruda ou vassourinha e as palavras santas ditas e retornadas.
Não posso e nem quero negar o amor que sinto por estas criaturas dedicadas ao cuidado do outro.
Para elas também levei meus filhos. E tenho verdades para contar:
Era uma manhã de sol, o calor fazia um dos meus filhos gostar de vestir apenas a cueca, nos seus dois aninhos de despertar no mundo, e assim saímos para visitar a parentela, descalço e de cueca. Na volta para casa, saltitava, corria e sorria, mas de repente parou, e atendeu ao chamado da natureza, colocando para fora o pênis infantil em exibição de urina longa, formando um arco brilhante por causa da luz solar.
Percebi o olhar encantado da mulher que o observava sorrindo.
Assim seguimos para casa, e em apenas alguns instantes ele começou a sentir ânsia de vômito, logo em seguida a vomitar, e foi parar no hospital. Após ser atendido e medicado, retornamos para casa com uma criança desfalecida nos braços. Após colocar o agora enfermo na cama, saí para fora de casa e avistei a caminhada lenta de Dona Eudócia, ou apenas Doça. Corri para ela dizendo o que tinha ocorrido. Entrou sem cerimônia e ao chegar no quarto e olhar para o entezinho que gemia afirmou precisar logo de três folhas de pião-roxo, que usou para benzer.
O olhar esverdeado da anciã de tez morena era piedoso. Me disse que aquele tipo de olhado não se tirava com uma única reza, eu precisaria de sete ou pelo menos três benzedeira para salvar o menino. Apostei que ficaria bom antes disso.
Ao meio-dia ele piorou. Voltamos ao hospital, mais injeção para conter o vômito e fui em busca de Dona Isabel, que morava distante, mas me acompanhou. Pediu folhas de vassourinha, e fez a reza, dizendo que o olhado era muito forte, mas a fé tudo podia. Perguntei se conhecia outra pessoa que benzia, ela me falou da Dona Perolina, a quem sequer eu conhecia.
Entramos pelo entardecer sem vômitos, mas pela noite a criança já não abria os olhos. Também não queria comer. E o medo cresceu na família. Alguém descobriu a morada de Dona Peró e pelas nove da noite levamos o embrulho nos braços, como se desacordado estivesse.
Éramos um pequeno comitê de desesperados, em busca de uma ajuda tão imensa através de um gesto tão simples de amor.
Fomos recebidos pela benzedeira que já aguardava com as folhas nas mãos. E rezou.
Terminado o ritual levantou o menino, que abriu os olhos, sorriu, disse que queria fazer xixi, e somente então percebemos que havia passado todo o restante daquele dia sem urinar. Assim como o xixi da manhã o fez adoecer, este o salvou da doença.
Incrivelmente, voltou correndo e brincando para casa.
Louvado Seja Nosso Senhor Jesus Cristo! Para sempre seja louvado!
Tempos depois aquela mulher responsável pelo mau-olhado, foi presa acusada de ter envenenado o marido e contratado a morte do homem que não a quis como amante. Para seu espírito hoje livre da carne, Deus conceda amparo misericordioso, pois a Graça do seu Amor é incondicional.
Dona Isabel e Doça, já correm livres pelos campos da eternidade, ajudando de outras formas os doentes de Jesus e Maria. Nada sabendo de Dona Peró, para ela rogamos também as luzes das bençãos divinas, e nossa gratidão pelo desinteressado gesto salvador.
Que neste mundo de dores aqueles que benzem possam viver muito, para auxiliar os necessitados do corpo e do espírito. Assim seja.
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