José Herculano Pires, em seu livro Agonia das Religiões, no capítulo I, afirma em determinado trecho que “o poder das religiões não é mais religioso, mas simplesmente econômico, político e social”. E é o que se constata ao analisar a atuação das religiões convencionais e mais difundidas no mundo ocidental moderno, principalmente no que se refere ao poder econômico e político, crescente de ano para ano. O social, por outro lado, embora ainda de vulto, vem decrescendo paulatinamente, quer por omissão ou conveniência dos dois primeiros campos de ação.
No capítulo II do mesmo livro, Herculano chama a atenção para uma situação bastante atual quanto à posição do homem no domínio das religiões: “O dilema do homem contemporâneo é SER OU NÃO SER RELIGIOSO”; isso porque, de acordo com sua reflexão e os fatos evidentes, “a religião transformou-se em questão opinativa”, em função das seguintes posturas – a) materialista – que se atém às convenções e necessidades terrenas; b) pragmatista – por uma questão de conveniência e até de moda; e c) espiritualista – que se volta mais para o problema vital de sobrevivência do ser imortal, naturalmente dentro dos respectivos conceitos religiosos.
Ele ainda assinala no mesmo livro que “o homem traz em si o sentido inato de religiosidade, visto que a ideia de Deus é inata no homem (...) É uma ideia evidente por si mesma e indispensável à compreensão de nós mesmos e do mundo.”
Custa-nos ainda hoje aceitar ser essa afirmação de que é a presença de Deus em nós que nos facilita compreender a nós mesmos e ao mundo. Jesus de Nazaré, mestre e irmão maior, já tentara nos fazer entender essa comunhão quando nos disse “Deus não está aqui, nem acolá; está dentro de vós” e, ainda, quando revelou a nossa filiação espiritual ao declarar “meu Deus e vosso Deus, meu Pai e vosso Pai”.
Contudo, séculos transcorreram durante os quais o que fizemos foi amordaçar esse Deus em nós e erigir uma série de procedimentos pretensamente religiosos, a maioria dos quais em absoluto desacordo com as leis naturais criadas a nosso favor e benefício. Elaboramos um deus humano, com nossos atributos, acreditando assim nos aproximarmos daquilo que, na verdade, já trazemos em nós desde o momento da criação: o sentimento inato de religiosidade, de adoração a Deus – que nada mais é do que a elevação do pensamento a Deus (OLE qs. 649 e 650), sem representações, títulos, paramentos e dogmas quaisquer.
A Doutrina Espírita, clara, objetiva e transparente, não deixando margem a nenhuma interpretação, nos oferece as suas três vertentes, tal como muito bem esclarecido por Allan Kardec em O Livro dos Espíritos, Conclusão, item VII: “O Espiritismo se apresenta sob três aspectos diferentes: 1º) o das manifestações, 2º) o dos princípios de filosofia e moral que delas decorrem e 3º) o da aplicação desses princípios.
Percebe-se nesses aspectos o seu cunho científico no primeiro deles; seu cunho filosófico no segundo; e seu cunho de religiosidade no terceiro ao enfocar a aplicação dos ensinamentos morais. Tanto que para o Evangelho Segundo o Espiritismo Kardec e os Espíritos que o assistiam recolheram dos evangelhos convencionais apenas a parte moral neles contida.
No item anterior (VI), Kardec enfatiza que “seria fazer-se uma ideia bem falsa do Espiritismo acreditar que ele tira sua força da prática das manifestações materiais, e que, portanto, entravando-se essas manifestações, pode-se minar-lhe as bases. Sua força está na sua filosofia, no apelo que faz à razão e ao bom senso.”
Por tudo isso e muito mais, se pretendemos conhecer o espiritismo, devemos meditar acerca do que significa SER OU NÃO SER ESPÍRITA, visto que SER ESPÍRITA requer o respeito aos princípios doutrinários escolhidos sem preterir nem preferir nenhum de seus aspectos, sem no entanto abdicar do uso da avaliação e análise de todo o seu conteúdo, além de assumir a nossa responsabilidade perante as leis da vida, com vistas ao nosso progresso individual e ao progresso de todos, a fim de construirmos, no trabalho e no esforço coletivo, uma sociedade mais justa e mais feliz.
Deolindo Amorim, um de nossos mais ilustres espíritas, fundador do Instituto de Cultura Espírita do Brasil, frisou: “o Espiritismo não veio apenas para aliviar, consolar, como se diz constantemente: ele alivia e consola, não há dúvida, mas desperta, antes de tudo, o sentimento de responsabilidade”. (1)
Para finalizar, transcrevo ainda um outro esclarecimento valioso de Deolindo Amorim: “O Espiritismo tem um programa básico: modificar a criatura humana, educá-la espiritualmente, emancipá-la de qualquer submissão a imagens e “fórmulas sacramentais”. Nele se ensina a religião natural, a religião da consciência cada vez mais esclarecida para sentir a existência de Deus como realidade suprema e onisciente e não como objeto de temor.” (2)
1) livro Relembrando Deolindo I
2) livro Espiritismo e as Doutrinas Espiritualistas
Entre o conhecer e o Saber,existe uma distância imensa chamada de praticar!
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